27 janeiro 2008

3º. Domingo depois da Epifania

Leituras

Profecia de Amós 3.1-8
Salmo 139.1-7
I Carta de São Paulo aos Coríntios 1.10-17
Evangelho de São Mateus 4.12-23



Missão no Mundo

Na Resolução intitulada “A Tarefa do Laicato”, a Conferência de Lambeth afirma que, “sendo membros batizados do Corpo de Cristo, os leigos participam do ministério sacerdotal da Igreja e são responsáveis pela sua realização”. E formula veemente apelo aos eclesianos em toso o mundo, no sentido de “levarem a efeito a sua vocação, integrando-se plenamente na vida da Igreja, dando testemunho cristão e dedicando-se a servir os propósitos de Deus no mundo”.
Já expuzemos as razões por que temos de tomar a Igreja como nosso ponto de partida, nossa base de operações. Lembremos, porém, que o ministério leigo, parte que é do sacerdócio da Igreja, se destina à obra de reconciliação do mundo com Deus, em Cristo, o nosso divino Sumo Sacerdote. Outra grande Resolução de Lambeth, sob a epígrafe “Deveres do Laicato”, declara: “Todos nós precisamos lembrar que o campo de serviço cristão dos leigos se estende principalmente na esfera secular, onde sua integridade e competência podem melhor ministrar às necessidades do mundo e à Gloria de Deus. O clero deve compreender isso e, pelo seu ensino e participação nos pensamentos e problemas dos leigos em seu trabalho cotidiano, auxilia-los a intensificar esse ministério”.
Costumamos dizer que a missão do Cristianismo no mundo é evangelizar, o que está certo. O problema é que nos habituamos a associar esse termo com a proclamação do Evangelho, de viva voz. Este é, porém, apenas um dos métodos de evangelização e nem sempre o mais eficiente. Pois evangelizar é, na essência, promover a reconciliação do homem com Deus, em Cristo. Este é o sentido profundo do ministério sacerdotal da Igreja, do qual deriva o ministério dos leigos, assim como as Sagradas Ordens. Reconhecemos que os leigos, e não o clero, é que tem o grande ensejo de penetrar fundo na vida profana de nossos dias e levar o Evangelho da Redenção a muitas almas que jamais seriam atingidas pelos processos comuns de evangelização.
Vivemos na era dos grupos profissionais que, não raro, se hostilizam mutuamente, ou se reúnem num clima de tensão e conflito. Os problemas sociais e econômicos se tornam cada vez mais agudos, sob a pressão de classes e partidos. Há famílias que sofrem golpes morais profundos, ou enfrentam a penúria ou o desemprego. Outras estão sob a ameaça do desmoronamento. A Igreja, em tais circunstâncias como instituição, pode parecer distante. Pode ser desconhecida. Pode mesmo não ser desejada. De quem partira, então, a palavra de paz, ou de conforto, ou de orientação construtiva – a palavra que será dita na hora exata e no local exato, com o suave poder de mudar o rumo dos acontecimentos? Só um operário poderia pregar este sermão no seu sindicato, o sermão do seu testemunho vivo. O mesmo diríamos de todos os demais setores de atividades seculares na sociedade contemporânea.
Compondo esta Pastoral principalmente para os nossos dedicados irmãos leigos, insistimos num ponto que consideramos indispensável ao bom êxito de nossas iniciativas. Cuidemos que o conteúdo espiritual de todos os movimentos e organizações na Igreja correspondam sempre aos objetivos redentores de Deus em Cristo, e que todos os nossos esforços tenham sempre em vista a consecução desses objetivos. Tal conteúdo espiritual incluirá certamente um sólido fundamento teológico, a segurança das grandes convicções, a fé que floresce em atos litúrgicos de adoração a Deus, não menos que em atos de solidariedade e de reconciliação entre os homens.
[fonte: Krischke, Egmont Machado. “Crise e Renovação”. Porto Alegre: ed. Metrópole/publicadora Ecclesia, pg. 78-79]

20 janeiro 2008

2º Domingo depois da Epifania

Leituras

Profecia de Isaías 49.1-7
Salmo 40.1-10
1ª. Carta de São Paulo aos Coríntios 1.1-9
Evangelho de São João 1.29-41


São poucos os que amam a Cruz de Jesus Cristo

1. Jesus Cristo tem agora muitos que amam o seu reino celestial, mas poucos que levam a sua cruz. Muitos desejam sua consolação e mui poucos desejam a tribulação. Encontra muitos companheiros para a sua mesa, mas poucos para a sua abstinência. Todos querem gozar de sua alegria, poucos, porém, querem sofrer alguma coisa por Ele. Muitos seguem a Jesus até ao partir do pão, poucos, porém, até ao beber do Cálice da sua paixão. Muitos admiram seus milagres, mas poucos abraçam a ignomínia da cruz. Muitos amam a Jesus, quando não há adversidade. Muitos o louvam e exaltam, enquanto recebem dele algumas consolações. Porém, se Jesus se lhes esconde ou deixa por algum tempo, logo se queixam ou desanimam.
2. Aqueles, porém, que amam a Jesus por amor de Jesus e não por amor da sua própria consolação, tanto o louvam em toda a tribulação e angústia de coração, como nas mais doces consolações. E ainda que nunca mais lhes quisesse dar consolação, sempre o louvariam e lhe dariam graças.
3. Oh! Quanto é poderoso o amor de Jesus, quanto é puro e sem mistura de interesse ou de amor próprio. Não são por ventura mercenários os que sempre buscam consolações?
Não se amam a si mais que a Cristo os que de contínuo pensam em seus proveitos e comodidades? Onde se achará algum homem que queira servir a Deus, de graça? Ainda entre as pessoas espirituais raramente se encontra uma que viva inteiramente desapegada de tudo.
4. Quem descobrirá, pois o verdadeiro pobre de espírito e desapegado de amor de todas as criaturas? “Pérola preciosa que é necessário buscar até às extremidades da terra”. (Prov. 31.10). “Ainda que o homem dê por ela quanto possui, nada dá” (Cant. 8.7). Se fizer grande penitência, ainda é pouco. Ainda que compreenda todas as ciências, está longe dela. E se tiver grande virtude e mui fervorosa devoção, ainda lhe falta a coisa mais necessária. Qual é essa coisa necessária? É que, deixado tudo, se deixe a si mesmo, e saia totalmente de si e não lhe fique nada de amor próprio. E quando tiver feito quanto crê dever fazer, ainda se persuada de que nada tem feito.
5. Não tenha em muito que o avaliem por grande, mas confesse com toda a sinceridade que é um servo inútil, como dia a Verdade eterna: “Quando tiverdes feito tudo que vos é mandado, dizei: Somos servos inúteis”. (Lc. 17.10). Quando o homem chegar a este ponto, então poderá chamar-se verdadeiro pobre de espírito e desapegado de tudo, e dizer com o Profeta: “Sou pobre e só no mundo” (Sl. 24.16). Ninguém, todavia, é mais rico, ninguém, mais poderoso, ninguém, mais livre que aquele que sabe deixar-se a si e a todas as coisas, e pôr-se no último lugar.

[St. Thomas à Kempis, “Imitação de Cristo”. São Paulo: Ave Maria, 23ª. ed., cap. XI, pg. 172-175.]

13 janeiro 2008

1º. Domingo depois da Epifania

Leituras

Profecia de Isaías 42.1-9
Salmo 89.20-29
Atos dos Apóstolos 10.34-38
Evangelho de São Mateus 3.13-17

Os textos deste domingo trazem as impressões elementares para uma cristologia messiânica. Um novo sinal da ‘epifania’ cristocêntrica no Batismo de Jesus Cristo. Por isso, o primeiro domingo depois da Epifania também é chamado de domingo do Batismo de N. Sr. Jesus Cristo. O mistério apontado pela coleta reside na manutenção da aliança batismal feita em Jesus Cristo, por isso nossa ênfase será essa entre tantos temas transversais às lições dominicais. A releitura cristã do ‘Canto do Servo’ na Profecia de Isaías encontra seu paralelo no Evangelho de Mateus. Em Isaías, Javé dá o Espírito (Ruhi) ao seu Servo – o mesmo que pairava sobre as águas em Gn. 1 – para o Julgamento das nações. Em Mateus após o batismo de S. João Batista, o céu se abre, o Espírito de Deus (Pneuma tou Theou) repousa em forma de pomba e uma voz rompe o silêncio. A unção de Jesus Cristo com o Espírito de Deus é o marco inicial de sua missão entre a humanidade, após esse acontecimento Jesus vai para o deserto para sua preparação. O Salmo 89 nos fala da unção de Davi e a palavra servo (v.20) também é utilizada. Os medievais irão chamar a Plenitude de Cristo como “gratia unionis”. Não propositalmente o texto se enquadra neste domingo. Em todo o tempo da Epifania, a messianidade régia de Jesus é defendida pelos evangelistas, e a ligação direta com Davi teologicamente é necessária. Jesus o servo ungido por Javé como Davi. Essa conotação é dada por Pedro em seu discurso nos Atos dos Apóstolos quando diz que Jesus foi ungido com o Espírito Santo e com Poder (dünamei – melhor traduzido por potência), a força criadora do Universo. O texto é perpassado por uma cristologia do espírito (pneumo-cristologia).
O batismo de Jesus não deve ser modelo doutrinário para o batismo cristão, pois certamente não foi batismo de arrependimento e ‘novo nascimento’ como a construção paulina do sacramento, mas como o texto evangélico diz: para que se cumpra a lei (justiça). Por isso,o próprio S. João Batista hesita em batizá-lo. Entretanto o batismo de Jesus o alinha com toda a esperança escatológica do Reino de Deus. Em Isaías, o servo é chamado para ‘abrir os olhos dos cegos’ – libertação da alienação, ‘soltar do cárcere’ – libertação da opressão e ‘libertar os que habitam nas trevas’ – libertação da ignorância (v.7). Em Atos, Pedro diz que Deus não faz acepção de pessoas (v.34), ou seja, não toma partido; e em Isaías o Servo é chamado para ser Luz das nações (v.6). Interessante também reparar a intensa Teologia da Criação no v. 5 de Isaías. Jesus é chamado para uma Nova Aliança, para a restauração de toda a criação para a Nova Criação. A novidade da Nova Criação já é antecipada por Isaías: ‘coisas novas vos anuncio!’ Esta aliança é a que fazemos em nosso batismo e lembrada pela coleta de hoje para que zelemos por ela. É pelo zelo aos votos de nossa aliança batismal que mantemos a esperança de nossa salvação em Jesus Cristo. S. Pedro nos diz que ‘Deus estava com ele’, uma inversão de S. João cap. 1, que nos diz que o verbo estava com Deus no princípio de todas coisas. Na Nova criação, Deus está com o Verbo, encarna-se. A pergunta de todos os tempos: “Onde encontraremos a Deus?” A comunidade das origens cristãs não hesita em responder de maneira paradoxal: “Deus está em Cristo!” Jesus é o Emanuel, o Deus conosco e do nosso lado. A efusão do Espírito sobre Jesus, permite reler a história de trás para diante e reconhecer a vocação de toda a criação para Cristo desde o início.

06 janeiro 2008

Epifania

Leituras
Profecia de Isaías 60.1-6, 9
Salmo 72.1-2, 10-17
Carta de São Paulo aos Efésios 3.1-12
Evangelho de São Mateus 2.1-12



“Onde está o recém-nascido Rei dos Judeus?” Esta é a pergunta intrigante do texto de São Mateus. O conto da visita dos magos do Oriente, e que depois na tradição foram contemplados como Reis-Magos Gaspar, Baltazar e Melchior, nos atentam para a grande promessa messiânica presente especialmente no profeta Isaías, que diz que o Emanuel, será “Luz” para todas as nações, luz para os gentios. O que o evangelista recorda é a messianidade de Jesus e a universalidade da salvação. Jesus é primeiramente procurado por “gentios”, para ser cultuado, expressão mais coerente com o verbo ‘proskünésai’ (prostração, reverência), tema que será tratado por São Paulo. A mesma palavra é utilizada por Herodes no v. 8 de São Mateus, entretanto misteriosamente os magos são avisados em sonho sobre sua verdadeira conspiração. Certamente a matança dos Santos Inocentes gerada por Herodes justifica a fuga dos magos por outro caminho, despistando o poder opressivo e tirânico, do menino-Deus ainda tão frágil ao colo da Virgem Maria. A Estrela-Guia sinalizou aos magos o lugar exato em que estava o menino, e o v.10 enfatiza a grande alegria sentida por eles ao ver novamente a estrela, e diz: ‘regozijaram com uma alegria muito grande.’ Ao encontrar o menino lhe ofereceram ouro, incenso e mirra. Estes presentes simbolicamente representam as oferendas dadas a um Rei (ouro), a um Deus (incenso) e ao Soberano vitorioso da morte (mirra - utilizada para embalsamar os corpos). A alegria é a marca física mais expressiva do encontro do homem com Deus. A inesgotável e imensurável alegria ao encontrar Jesus desdobra-se no mais genuíno culto de louvor ao Messias. Prostração e tributo em oferendas nada medíocres são sinais da intensidade do mistério revelado. Em dias em que nem alegria, e muito menos tributos são oferecidos ao Senhor nas Igrejas, questionamos nosso próprio sentido de adoração. Onde está o “recém-nascido” Jesus? Se W. Temple está correto em sua afirmação, então é através da adoração que encontraremos a santidade de Deus. Então a adoração pública a Cristo, deverá ser o encontro real das pessoas com Ele, o recém-nascido. Assim, não de forma apelativa, os “gentios” saberão reconhecer entre os cristãos, o “espírito” do Cristo presente, manifesto, em uma Epifania. Na carta aos Efésios, São Paulo destina suas palavras aos “pagãos”, entretanto a palavra utilizada é ‘etnon’, dando mais a entender ‘povo – nação’. No v. 4, Paulo fala acerca do “Mistério de Cristo”. Que mistério era esse? O mistério segundo Paulo é revelado pelo Espírito, e sua mensagem era a da participação no mesmo “corpo” [místico] e de partilhar da mesma “promessa”. São Paulo entende que é através da adoração a Cristo que participamos da nova realidade da fé e observamos “a incalculável riqueza de Cristo.” (v.8). Na profecia de Isaías, Jerusalém emana a Luz divina. Ao seu redor, todas as nações estão cobertas de trevas, escuridão e névoa. A luz de Jerusalém alcançará todos os povos, e por ela todos serão guiados. No v.5, Isaías diz que o coração explodirá de grande emoção, e trarão as riquezas e os tesouros. No v.6 ele diz que uma grande quantidade de camelos invade Jerusalém trazendo ouro e incenso. Esse é um importante paralelo com o Evangelho. Nós, recebido o Espírito Santo, portamos essa luz que é de Cristo, e que é Cristo manifesto em nossas vidas. A devoção diária, o serviço e a piedade, a adoração e a presença sacramental da Igreja em nossas vidas manifestam (epifania) a Luz de Nosso Salvador. E se as pessoas perguntarem: Onde encontrarei Deus? Saberemos dizer onde está a Estrela-Guia.