20 maio 2011



A contribuição da IEAB para a extensão do Reino de Deus no Brasil.
Por Sérgio Wrublevski
Estudante do Curso à Distância do SETEK
(Rio de Janeiro, Abril 2011).

I – O movimento da comunidade anglicana no Brasil
Nestes quase 150 anos o movimento da comunidade anglicana no Brasil tem se caracterizado por querer ser um movimento de implantação da Igreja Anglicana no Brasil, e ao mesmo tempo, em querer ser parte da dinâmica católica de expansão da fé de Jesus Cristo por toda a terra.
1.1 O movimento de expansão e consolidação da comunidade anglicana em terras brasileiras
Este movimento se deu promovido pela iniciativa da Igreja Episcopal dos Estados Unidos (The Episcopal Church) a partir do final do século XIX. Uma das características mais importantes é que esta expansão missionária se realizou através de figuras de grande força de espírito, que fizeram surgir em pouco mais de 100 anos, toda uma comunidade anglicana bem fundada, organizada em dioceses, paróquias, escolas, autônoma tanto administrativa como financeiramente. Encontramos esta força de espírito em muitas figuras desta época, marcados por uma grande generosidade e pioneirismo, boa vontade e universalidade.
Além desse potencial humano de grande força, os líderes da Igreja Episcopal dos Estados Unidos eram marcados por uma boa formação, que os fazia distinguirem-se da maioria dos missionários por um saber de máxima competência e por uma disponibilidade de abertura para o outro, para a integração com a alteridade sempre provocante dos novos tempos e novos contextos culturais. Assim sabemos muito pouco dos nomes e das biografias individuais que caracterizaram tais personalidades, mas, de outro lado, vemos na obra de evangelização, que deixaram, um traço de sadio crescimento, de disposição de auto-crescimento em todos os mais diversos contextos desafiadores. No pouco eles sabiam ater-se ao essencial e a fazer este essencial deslanchar de modo grande e sólido.
1.2 Contexto histórico do Brasil:
A comunidade anglicana no Brasil foi se expandindo nestes últimos cem anos através de duas formas. De um lado a comunidade anglicana se formou ao redor de cidadãos ingleses ou de língua inglesa que realizavam nestas terras uma tarefa profissional. Estes grupos fizeram surgir as comunidades anglicanas de língua inglesa que perduram até hoje, especialmente entre militares, trabalhadores de grandes multinacionais de língua inglesa e diplomatas. De outro lado, a comunidade anglicana brasileira surgiu através de um trabalho de evangelização próprio, criando comunidades paroquiais e diocesanas nas mais diversas regiões do país. Este segundo movimento foi possibilitado pelo envio missionário sustentado pela Igreja Episcopal dos EUA.
Tais missionários chegaram no tempo em que o país iniciava sua expansão como comunidade econômica e social republicana, comunidade formada dos mais diversos grupos étnicos, necessitados, antes de tudo, de formação. Foi, sem dúvida, neste contexto multi-étnico, onde tudo necessitava ser construído, que a comunidade anglicana, com sua abertura para o diverso e a integração com a catolicidade e apostolicidade encontrou facilidade de expandir-se, de formar solidamente os seus líderes, e de formar um sadio grupo de sacerdotes, teólogos, diáconos, etc. Lendo os informes históricos tem-se a impressão que o entusiasmo por esta forma de catolicidade e apostolicidade anglicana resolvia muitos problemas com leveza e em pouco tempo devido ao ânimo evangelizador.
1.3 Niilismo moderno e crise da evangelização como tal.
A partir dos anos 30 se iniciou no país um modelo desenvolvimentista, que, especialmente a partir de 1950 foi rapidamente implantando a civilização industrial moderna. A partir dos anos 70 o povo brasileiro passou a viver as mesmas dificuldades e chances que a grande parte dos povos europeus já vivia desde o final da segunda guerra. Com o fascínio científico-tecnológico todas as produções e realizações espirituais entraram aos poucos numa grande crise: não só a arte, também a religião, a cultura de maioria católica e superficial, as formas tradicionais de vida no campo e na cidade pequena entraram em crise, e experimentaram a exigência de uma retomada para poderem continuar a terem um sentido valioso e digno do empenho das novas gerações. De repente todos os homens vivenciavam a inexorabilidade da morte de Deus e também a morte do homem, isto é, a morte de uma concepção tradicional acerca de Deus, do mundo sacral-religioso, como crise que exigia um novo modo de ser e interpretar o mundo do homem no Todo de modo novo.
A morte de um Deus proveniente de uma metafísica impessoal, sistemática e panorâmica é também a morte de um homem marcado pela unilateralidade do racionalismo metafísico. Já o homem, vendo diluir-se o predomínio racionalista, tenta inverter o sentido de uma metafísica sensualista, centrada no alto grau de intensidade emocional. A reação contra a metafísica tradicional faz surgir outra metafísica ainda mais curta, egocêntrica e desumana.
Se, de um lado a metafísica tradicional afasta o homem da proximidade das coisas e também do sagrado, a inversão niilista nada mais faz do que exacerbar a mesma estrutura, apenas com os sinais invertidos. Na época do fim da metafísica (também chamada de pós-modernidade) o homem começa a entender agora a possibilidade de um novo sentido de ser que lhe abre de modo mais originário a experiência do sagrado, na sua imensidão e profundidade, livre do açodamento metafísico como das novas versões da metafísica (sensualismo, psicologismo, sociologismo, esteticismo, etc).
A redescoberta de um sentido originário do sagrado de modo não-metafísico torna possível redescobrir o encontro com o inesperado e sempre novo do divino, seja na forma da pura e incondicional doação do Pai, ao criar o Filho, seja do puro sacrifício do Filho, que preferia ser servo de toda a criatura do que reter-se igual ao Pai, seja na forma do Espírito Santo, que recorda a pura doação do Pai Criador e do Filho Redentor na mediação de cada realização histórica. Este serviço de concreta adoração do Deus Triuno é que pode renovar, fortalecer e plenificar o Reino de Deus em nossas comunidades e em nosso país.
Tal serviço de adoração ao Deus Triuno inclui o concreto e criativo engajamento pelo outro, pela alteridade das coisas e dos homens, nos quais unicamente a força divina pode se encarnar e levar à plenificação a obra inaugurada pelo Pai, intencionada por Jesus Cristo e realizando-se na concreção singular do Espírito Santo.
Neste contexto pode-se falar de “estratégias” que a IEAB estaria usando ou deveria usar para que o reino de Deus se estenda em nosso país?
Ao longo da História da Igreja de Cristo, os discípulos de Cristo sempre tiveram oportunidade de pensar planos, metas parciais (envio de missionários, suporte financeiro e organizatório, autonomia parcial das igrejas regionais e nacionais, formação de suas lideranças (sacerdotes e laicos), plano pastoral para os próximos anos, etc.) em todo este processo nós, humanos, só conseguimos compreender antecipadamente a história por pouquíssimos anos. Isto não significa que devemos cruzar os braços e esperar que a história aconteça automaticamente, nem que a história se deixe decifrar pelos cálculos e previsões de uma confissão religiosa particular. Esta será sempre uma visão parcial.
A verdade da História é sempre a verdade do Todo (Hegel). Tão somente quando cada realização humana faz o melhor de si numa integração com a diversidade é que consegue entrever o caminho essencial de sua própria identidade. Para realizar com êxito esta abertura para com a dinâmica instantânea do Todo na concreção particular, cada realização humana deverá buscar realizar, enquanto realização criativa conseguida no limite da possibilidade humana, o real da Realidade no seu Todo. No fazer, que implica a renúncia de todo o subjetivismo, é que o fazer humano se torna submissão, em última análise, a Deus, colocando-o assim em destaque. Só assim Deus se torna o único e último juiz de todos os nossos juízos. Cada homem terá que fazer de tal modo que Deus subsuma tudo. Se Ele não o fizer, de nada adiantará ter dado a vida pelos irmãos, construir comunidades, etc.
Fazer a vontade de Deus exige que quem a faz, não pode dizer para si que sabe a vontade de Deus, mas terá que colocar toda a sua vida em risco para fazer a vontade de Deus.
Todo o amor a Deus e ao próximo tem de estar ligado um no outro, ambos têm de ser amor a partir de Deus e para dentro de Deus; só assim o amor ao próximo não vira simples prepotência humana.
Que significa aqui realizar, trazer à fala a verdade? Em todo o falar temos de falar tudo com Deus, em Deus e por Deus. Só assim a nossa fala deixa de ser mero instrumento de comunicação e se torna articulação da dimensão religiosa crística enraizada na concreta realização história, ou seja, numa determinada questão. Assim, para Agostinho, por ex., a pregação jamais era pura retórica e sim, percussão, anúncio do ser do Deus de Jesus Cristo.
Apesar de todas as nossas estratégias montadas na pretensão de promover e calcular a História, fundamentalmente nos damos conta de que “o Espírito sopra onde quer”. Basta um pouco de boa vontade para captá-lo, intuí-lo. Esta captação não é da competência humana, mas, às vezes, por pouco tempo se instaura com grande claritude, e esta é a dinâmica do historiar-se. Não seria esta a unção do espírito sagrado que, então, subsume todo o racionalismo, silenciando-o, e nos ensina a assumir tudo positivamente, como um imenso amor e ternura por Jesus Cristo?