26 dezembro 2008

27 de Dezembro de 2008 • Natal do Senhor I

Leituras
Livro de Eclesiástico 3.2-6, 12-14
Salmo 147
Carta aos Colossenses 3.12-21
Evangelho de São Lucas 2.22-40

Maria e o nascimento do Senhor

O nascimento virginal, como a Igreja ensina, será mesmo parte de nossa fé cristã? Esta é uma pergunta oportuna no tempo em que celebramos o nascimento de Jesus. Quando estivemos, na Eucaristia do Natal, dissemos estas palavras: “ ... e encarnou, por obra do Espírito Santo, da Virgem Maria.” Quando rezamos assim, estamos mesmo significando o anúncio da Igreja ou trata-se só de um pedacinho do Credo pelo qual passamos sem muita atenção? Em outras palavras: cremos mesmo que o nascimento virginal é parte necessária de nossa fé? Já houve um bocado de grandes nomes da teologia e de outros cristãos que afirmaram não ver no nascimento virginal um componente necessário da Fé Cristã. Estritamente falando eles podem estar “certos” no sentido de que nossa fé no Senhor Jesus não depende do nascimento virginal e sim da Ressurreição. A base da pregação e ensino apostólico sempre foi o anúncio da Ressurreição do Senhor. O nascimento de Jesus nem aparece, por exemplo, no Livro de Atos dos Apóstolos. O ponto central de nossa fé reside no evento da Páscoa.
De qualquer forma, o ensino sobre o nascimento virginal sempre foi uma tradição solene, forte, séria e inspiradora da Encarnação, central para a fé e a teologia Anglicanas. É o que designamos como um dos mistérios divinos. Deus se relaciona com a ordem criada sob formas que somente compreendemos em parte. Quando o santo Espírito de Deus vem sobre nós mesmos, somos efetivamente transformados! Por vezes somos até maravilhosamente curados! Muitas outras coisas formidáveis Deus opera em nossas vidas quando estamos em comunhão com Ele. Por que seria diferente com a menina Maria?
O encontro de nossa Senhora com o anjo Gabriel é um dos instantes mais encantadores em que vemos Deus tocar o mundo de forma tão especial. Ele não estava agindo contra as leis da natureza mas atuava com a ordem natural sob uma forma que ia ao encontro da resposta maravilhosa da adolescente Maria. Deus chamou Maria para ser instrumento da vinda do Ungido de Deus (o Cristo).
Quando Maria respondeu, ela foi também poderosamente tocada por Deus. Assim, a segunda Pessoa da Bendita Trindade foi nela concebida como ser humano.
O nascimento virginal é parte de nossa fé e nós o acolhemos com alegria e encanto. Não necessitamos de qualquer análise “científica”. Deus atuou e veio dentre nós de forma única como o fez em Jesus nosso Senhor. Igualmente de forma maravilhosa e misteriosa, Deus continua a vir até nós sob as formas de pão e vinho, quando recebemos o Corpo e Sangue de Cristo na Santa Eucaristia. O que verdadeiramente importa é que nós, com a Bem-Aventurada Virgem Maria, entremos em comunhão com Deus. Ele sempre anseia em partilhar seu amor e exuberância de vida conosco.
Rezemos para que todos os que lerem este texto tenham também um Santo Natal, um nascimento transformador em suas vidas.

21 dezembro 2008

21 de Dezembro de 2008 • Advento IV

Leituras

II Samuel 7.1-5, 8-11, 16
Carta aos Romanos 16.25-27
Evangelho de São Lucas 1. 26-3




Os Anjos, o Advento, o Natal e a Epifania

Nas leituras desta época do ano os Anjos do Senhor andam muito ocupados. Um deles visita Zacarias e diz que sua esposa teria uma criança. Outro aparece ainda à Maria, José, aos pastores e aos magos. Os anjos também apareceram a Moisés na sarça ardente; à Agar, a mãe de Ismael; e a Abraão quando preparava o sacrifício de seu filho Isaque. Jacó luta com anjo. Uma experiência devocional séria talvez fosse convidar pessoas da sua congregação que tivessem algum relato semelhante de visitação. Aquilo que pode parecer uma “reunião” bem breve (com escassos experiências...), pode bem acabar por se tornar um bom ciclo de relatos de visitações. É possível que o “tema” pareça piegas ou do gênero da bobice “new age”. Mas a Fé Cristã, com maturidade e inteligência, acolhe a presença dos anjos não só nos relatos bíblicos do passado mas na vida pessoal dos crentes em cada geração. Qual seria o seu relato da visitação de um anjo? O que teria feito com que o anjo o / a visitasse? O que foi que seu anjo disse? Estas são perguntas devocionais que vale aprofundar no tempo que já estamos vivendo, antes e depois do Natal do Senhor. Rezar é crucial para nós, o tempo todo. Mas o tempo do Advento é uma oportunidade muito especial para que se reúnam pequenos grupos (ou em família) para que se amadureça na busca de Deus. O exercício devocional que referimos antes pode ser uma ocasião de crescimento e comunhão justamente agora quando nos preparamos esperando pela vinda do bem mais valioso! Se você entende que a intensidade do esforço ou a pequenez de sua fé são mpedimentos, recorde que o Deus Altíssimo vem à nós como um nenê. Isto não é só surpreendente. É também perigoso! Os nenês, afinal são fracos, incapazes de se defender, necessitam de cuidados e, não devemos esquecer, não conseguem dizer muita coisa! O hino 20, Pequena Vila de Belém, composto pelo Revdo. Philip Brooks, mais tarde Bispo de Massachusetss, foi pela primeira vez cantado no Natal de 1868. A terceira estrofe nos ensina assim: “...sereno e sem alarme, vem Ele ao mundo assim, trazendo aos homens
redenção, amor e paz sem fim.” Sereno e sem alarme!

14 dezembro 2008

14 de Dezembro de 2008 • Advento III

Leituras
Isaías 61.1-2, 10-11
Salmo 126
I Tessalonicenses 5.16-24
S. João 1.6-8, 19-28



Advento


O Advento desmantela o nosso mundinho arrumado por conveniência pessoal e nos prepara para um mundo radicalmente maior que é o universo do amor de Deus. O Natal de Jesus é o melhor sinal destas coisas. O Advento não é um tempo para disfarces. Nele, o que está oculto deve vir à luz. É tempo de tremor. Ele nos envolve como que numa espécie de terremoto, sacudindo os padrões nem sempre verdadeiros ou maduros que dominam a experiência humana. Esta a razão porque as leituras dos domingos nos sugerem transformação e apocalipse. É como se o Advento fosse um tempo de demolição, de preparação do terreno para a construção do que é genuinamente novo. No calendário da Igreja do Ocidente ainda antes do século VI, o Advento parece ter-se desenvolvido como um tempo preparatório e então, penitencial, enraizado no ensino da esperança. O Advento participa assim da visão bíblica do arrependimento e da esperança, particularmente na figura de João, o Batista, rudemente pregando pelos caminhos do deserto, clamando por contrição e batizando os que se prontificavam a esperar pela Soberania de Deus. Enquanto os mensageiros trazem até João a resposta de Jesus, o Mestre se volta para os presentes e inicia uma revelação apaixonada que antecipa o que lhe passa pela mente naquela hora crítica. Jesus começa por mostrar a importância do papel do João na economia de Deus. Diz ele que João é o maior dentre os nascidos de mulher e que com ele a era profética se encerrava e um tempo novo se abria. Jesus sabe que no Reino do Pai há um só que é grande, Ele mesmo, ainda se sinte ainda menor que João numa escala popular de valores, alguém que voluntariamente aceita o papel mais humilde (São Lucas 22.25-27), mas que em breve será revelado como o Filho do Homem em poder. Tudo isto nos empurra a pensar melhor sobre nossas vidas como cristãos. Nelas, também nossas atitudes. Pensando sério, não podemos evitar de refletir sobre o impacto das atitudes em nossas vidas. Elas talvez sejam até mais importantes que os fatos. Mais importantes que o passado, que a educação, que o dinheiro, que as circunstâncias, que os fracassos, que os sucessos e do que os outros pensam ou dizem. São até mais importantes que as aparências, que os nossos dons e habilidades.
Nossas atitudes podem quebrar uma comunidade, a igreja e a família. Mas o que há de encorajador é que Deus nos dá a oportunidade de considerar as atitudes que tomaremos no dia. Não podemos mudar o passado. Não podemos mudar o fato de que as pessoas agirão de um certo modo. Não podemos mudar o inevitável. A única coisa que podemos efetivamente é tocar a única corda de que dispomos... nossa atitude. A vida talvez seja 10% do que nos acontece e 90% de como a ela respondemos. Neste tempo do Advento, de terremoto nos nossos padrões e revelação das coisas que só Deus conhece, rezar mais sobre nossas atitudes é também um exercício penitencial.

07 dezembro 2008

7 de Dezembro de 2008 • Advento II

Leituras
Isaías 40.1-5, 9-11
Salmo 85
II Carta de S. Pedro 3.8-14
S. Marcos 1.1-8


Esperando pela Vinda

“Advento” significa “vinda”, em Latim. É a primeira estação do Ano Cristão e tem quatro domingos. A coroa do Advento, um círculo como coroa, verde, com 4 velas, uma para cada domingo ou, conforme uso mais recente, com uma quinta vela no centro, parta a festa mesma do Natal. Nesta quadra, o Glória e outros hinos de louvor devem ser omitidos e a Igreja se move para a Oração Eucarística II que enfatiza mais a Encarnação (Cristo plenamente humano e plenamente divino). Durante estas semanas todas nós nos preparamos, corações e mentes para celebrar com plenitude a festa do Santo Natal do Senhor. Lembremos que não se trata do dia 25 somente mas do período que vai de 25 de Dezembro até 5 de Janeiro. É um tempo em que olhamos para o primeiro Natal e aguardamos, confiantes, a Segunda Vinda. É um tempo de preparação, expectativa, espera, zelo, compaixão, solidariedade e esperança. Não menos importante é que as crianças sejam instruídas a perceberem a distinção entre o tempo do Advento e o tempo do Natal. O comércio tornou isso muito difícil mas, por isso mesmo é ainda mais necessário! As crianças (e ao adultos não menos!) precisam aprender que este é muito mais que um
tempo para compras... O Advento é um tempo para reconciliação e perdão, tempo para servir e alcançar àqueles a quem talvez tenhamos magoado. É tempo para ser luz na escuridão. É tempo para refletir e continuar nossa jornada com Jesus Cristo, Senhor das nossas vidas. Embora a oração seja crucial em todos os momentos, o Advento é uma oportunidade especial para que nos ofereçamos ao serviço de Pai.
Austin Farrer é o nome de um Anglicano que temos citado semanalmente no blog do SETEK (www.setek-setek.blogspot.com). Farrer foi um dos grandes “divines” no meio do século XX, professor em Oxford, teólogo, filósofo, capelão, além de ser pároco e amigo de outro nome não menos conhecido como o de C. S. Lewis. Seus sermões são uma mistura única de clareza teológica, qualidade literária e realismo prático. Em um destes (Fish out of the Water, 1960) ou, “Peixe fora d’água”, ele nos aconselha sobre a preparação para a Santa Comunhão: “É difícil prepararnos para a Comunhão já que não é fácil encarar a verdade. Mas não é complicado demais nem enigmático. Você deve simplesmente aceitar aquilo que sabe que Deus exige de você, além de renunciar ao que você sabe que ele proíbe... e arrepender-se. Lembre de algo pelo qual deve dar graças e alguém por quem rezar... e assim você terá sua preparação.” Não poderíamos fazer nada melhor neste Advento que seguir o conselho de Austin Farrer.

30 novembro 2008

30 de Novembro de 2008 • Advento I

Leituras

Profecia de Isaías 63.16-17; 64.1,3-8
Salmo 80I
Carta aos Coríntios 1.3-9
Evangelho de São Marcos 13.33-37


Gravidez, Tempo de Espera

É simples assim. Há coisas pelas quais devemos esperar. Como o nascimento de uma criança. Não importa o quão fatigante possa ser o tempo da gravidez, não se pode apressar o processo. Isso pode ser frustrante e interferir com outros planos. Pode até nem ser conveniente mas não é algo que se possa mudar.
Algumas coisas na vida estão fora de controle. Esperar é uma experiência de desenvolvimento e maturação espiritual. Ao esperar, nos preparamos fazendo arranjos, mudando planos, ajustando sentimentos, tudo para receber o novo evento. A criança, por exemplo, não está pronta para se tornar adulta porque há todo um mundo de experiências que precisa conhecer antes de chegar lá. Os adolescentes são especialmente ansiosos para se fazerem adultos e têm uma grande necessidade em esperar. Esperar é também uma experiência espiritual.
Nós todos não esperamos por nossas mortes. Como é mesmo que usamos o tempo? Não será isso o que mais importa espiritualmente? Se estamos todos destinados à salvação, por que Deus então não arruma as coisas de forma que não precisemos esperar tanto? Por que Ele não nos alcança algum tipo de satisfação instantânea? A razão é a mesma. Assim como com a criança e com o adolescente impaciente, também não estamos prontos para esperar. Esperar é parte da transformação do feto. Da criança, do adolescente e, não menos, do adulto impaciente. Não estar em controle, não ser capaz em prover satisfação imediata... nos força a fazer algo mais, quer dizer, aceitar nossa vida como criaturas e não como deuses. A espera está no coração mesmo da relação com o Deus vivo. Ele não pula... só porque o chamamos, mas escuta nossa súplica e responde segundo o seu próprio tempo. Pode-se dizer que a espera nos ensina a não contar tanto com aquilo que queremos ou exigimos e com a forma como queremos isso ou aquilo. A vida não é assim. Quem tenta fazer diferente erra o alvo. Possivelmente vai passar muito tempo sozinho. Hoje, poucas pessoas estão prontas a confiar em um Senhor.
O Advento é um tempo, uma estação que inicia outro Ano Cristão. Há um sabor próprio, justamente a tensão da espera. Mesmo tanto tempo após o nascimento de Jesus, poucos dentre nós estamos prontos a receber o Verbo feito carne, o Deus que veio dentre nós, como um de nós! Não estamos preparados porque somos o que a Igreja chama de “pecadores”, quer dizer, preferimos mesmo ser como Deus e fazer as coisas de nosso jeito. O tempo do Advento do Senhor nos alcança uma oportunidade de experimentar mais uma vez o conflito interior que se colocou em movimento com o anúncio de que Deus se faria como nós ou ainda, que Ele está dentre nós e convivemos com Ele. O Advento pode ser um tempo muito rico devocionalmente se nos entregamos a ele de todo o coração. O Advento pode nos fazer mais humildes, mais pacíficos,
mais realistas a nosso próprio respeito e ao próximo. Ele tem sido, por tantos séculos, uma ferramenta muito útil para ajudar os cristãos a crescerem como as criaturas que Deus deseja. Um bom tempo do Advento nos ajudará a crescer como pessoas, se a ele nos submetermos. É matéria de crescimento espiritual. Experimente. Talvez não gostemos de tudo.... mas haverá transformação.
O Advento é uma intensificação daquilo que a vida cristã é: nós esperamos e, esperando, rezamos. Na oração, discernimos a Presença e ação do Pai. “Vem, Jesus, tão esperado, nossas almas libertar do temor e do pecado. Vem a tua paz nos dar.”


Hino nº 1, do HE

23 novembro 2008

23 de Novembro de 2008 • Domingo Anterior ao Advento • Festa de Cristo Rei

Leituras
Profecia de Ezequiel 34.11-12, 15-17
Salmo 95.1-7
I Carta aos Coríntios 15.20-26,28
São Mateus 25.31-46


A Vontade de Deus e a Minha


“Nossa liberdade e anseio por independência são muito escassos: é só a superfície consciente da mente; mas há então, uma grande profundidade abaixo, da qual temos uma noção muito pobre, e que, sem dúvida, afeta nossas ações em extensão indeterminada.Quando eu ainda tentava nadar, me sentia valoroso ao percorrer algumas águas mais profundas; mas tomava o cuidado para não pensar no terrível espaço abaixo entre os meus pés e o fundo; eu me concentrava na superfície e tentava me alegrar. É assim mesmo, sem dúvida, com nossa vida consciente. Nos mantemos à superfície da mente e achamos que somos livres. Fazemos um monte de coisas com nossas muitas atividades e iniciativas e ficamos com a impressão de que andamos na direção que escolhemos; mas se olharmos ao redor, considerando nossas coisas, veremos que a corrente foi o que nos conduziu.

O bom nadador, que não conhece a praia, se afogará em sua própria natação; ele não conseguirá nadar contra as ondas. Mas a familiaridade com a água certamente preservará o nadador comedido: ele conhece as correntes de fundo e saberá evitar o esforço. A maré prosseguirá em outro sentido mas ele avançará em outro, acima das águas perigosas.

Nós precisamos nadar, a menos que afundemos – quer dizer – precisamos exercer nossa vontade. Esforço inarredável, este tem sido o caminho dos santos. E ainda assim, por nossa vontade somente, muito pouco podemos fazer. Pois devemos amar... e este é o primeiro mandamento, a Deus – e ao nosso próximo, com o mesmo zelo de Deus: se não conseguimos amar, nada alcançamos: não, nada que falemos com a linguagem dos anjos, nada que dominemos em todos os mistérios do conhecimento, ou mesmo que demos tudo o que temos e nos vistamos como franciscanos. Não iremos a lugar algum sem amor; mas estará o amor no comando? Posso eu amar só por cerrar os dentes e fechar bem os punhos? Enrijecer os músculos, ferver o sangue, imitar o tigre? Não: que os céus nos salvem dos cristãos de tipo tigre, bufando como próprio demônio, buscando a quem devorar.

Sou instruído a amar, e o amor não está no comando; ainda assim, sei bem para onde as correntes da caridade fluem, e posso me associar a elas. Ezequiel teve uma visão (capítulo 47): um grande afloramento de água, clara, abundante e doce, brotou do solo do templo, em colinas muito áridas. O leste e o oeste foram envolvidos como por um dilúvio:na direção do leste, até o Mar Morto, e em toda parte, a água chegou, e a vida ressurgiu. As correntes de água doce se espalharam através das águas onduladas do lago, e onde quer que fossem, os peixes começaram a se reunir como enxames. Assim somos nós: assim são as nossas almas, vivas somente naquelas correntes suaves que fazem seu caminho e isto, desde o dia de Pentecostes, acalmando e curando o mar agitado. Será que podemos achar nosso caminho dentre estas correntes? Sim: podemos entrar em nosso quarto, fechar a porta, e rezar ao Pai nosso que nos escuta em secreto, em comunhão com o Redentor que nos deu este mandamento; e então podemos esperar por seu Espírito. Clamaremos por Deus e Deus mesmo dará o amor que nos impulsiona a Ele; lembraremos de nossos amigos e de nossos inimigos também, se temos tantos, e o cuidado de Deus por eles nos moverá. Deus é nossa liberdade, Deus é nosso poder: pois Deus é Espírito.”


Austin Farrer em Words for Life, editado por Charles Conti e Leslie Houlden, SPCK, Londres, 1993, página 23

16 novembro 2008

16 de Novembro de 2008 • Trindade XXVI

Leituras

Provérbios 31.10-13, 19-20, 30-31
Salmo 90
I Carta aos Tessalonicenses 5.1-6
Evangelho de São Mateus 25.14-30




PROVIDÊNCIA

“O relato do noivado de Rebeca (Gênesis 24) é uma destas decisões súbitas e inexplicáveis que ocorrem tantas vezes na Escritura. Rute, a moabita, tendo saído para ver sua sogra viúva, em seu caminho de volta para casa, Belém, de repente decidiu andar todo o caminho de volta com ela; se não o tivesse feito, Boaz não teria tido a esposa... e o rei Davi uma bisavó! A falta ou desconhecimento de uma bisavó não era pouca coisa: talvez a pessoa nem tivesse nascido ou, quem sabe, tivesse nascido como alguém totalmente diferente. A idéia, por si só, já faria alguém radicalmente hesitar. Em verdade, qualquer israelita poderia ter dito – ou pode ainda dizer – Onde estaríamos , nós Israel? Como seria Israel sem Rebeca como mãe? O misterioso homem idoso observou as pulseiras no pulso da jovem e olhou para seus olhos: ela se deu conta e concluiu. – Ele me quer para seu filho; e assim ele me terá. – Houve um bom momento de conversa depois disso... e os primeiros arranjos para o casamento. A coisa estava mesmo decidida. O que teria comovido Rebeca? Quem sabe? Labão, seu irmão, era seu guardião e suas filhas mesmas... dele fugiram trinta anos mais tarde; ele não tinha de fato o toque certo para tratar com mulheres jovens, e Rebeca agiu firme. Mas o escritor bíblico não evidencia o pensamento da jovem. Sem dúvida, o Deus de Abraão enviara seu anjo; Rebeca não sabia mesmo o que estava fazendo, mas a Providência sabia o que fazia por ela. Parece quase impossível não crer na Providência, quando consideramos tantas circunstâncias aparentemente tão mutáveis, ou decisões que vão e voltam, na história dos nossos ancestrais... as quais nos fizeram ser o que somos, ou mesmo, que simplesmente nos formaram.Céus! Que risco corremos quando um bisavô hesita... – é algo que quase nos faz parar o coração, só de pensar – estou certo de que ela não sabia do que se tratava; mas os anjos nos conduzem e preparam o caminho para um coração confuso.
Como Deus gerencia, segundo seus propósitos, as aparentes chances da vida, é simplesmente inexplicável; o fato mesmo do seu agir é, na hora, raramente evidente. Só mais claro mas bem depois. O que poderia ter sido mais providencial do que a traição de Judas ou a negação de Pedro? Contudo, a primeira abriu a paixão de Cristo, pela qual somos todos redimidos; e a segunda suscitou que a Igreja, alicerçada em Pedro, se fundasse em penitência e não em heroísmo; e assim mesmo sem sermos heróis, há esperança para todos, pois podemos todos arrepender-nos. Sem o controle de uma infinidade de circunstâncias acidentais, e das loucuras humanas, Deus não teria alcançado seu propósito e estabelecido nossa salvação. Assim mesmo, seu âmago não foi acidental. Quando Cristo permeneceu impassível diante do Sumo Sacerdote e disse que ele encontraria em poder aquele que agora condenava na fraqueza, nada de acidental havia aí, nada de surpreendente, nenhuma decisão impredizível, Providência alguma rejeitada ou ameaçada pelo toque invisível do dedo de um anjo. (São Marcos 14.62). Havia sim uma firme consistência de propósito, lealdade ao Pai e amor por nós; esta a mente invisível da Providência mesma, a vontade que move o mundo; e qualquer que tenha sido a ação de algum acidente providencial nos caminhos de Deus conosco, ele ainda nos salva indepedente das circunstâncias, sem manipulação. Nós não somos salvos a não ser pelo alcance sobre nós, da mente de Cristo.”

Austin Farrer
Words for Life, Providence, página 55
Editado por Charles Conti e Leslie Houlden SPCK, Londres 1993

09 novembro 2008

9 de Novembro de 2008 • Trindade XXV

Leituras

Livro de Sabedoria 6.12-16
Salmo 70
I Carta aos Tessalonicenses 4.13-18
Evangelho de São Mateus 25.1-13

Chamados a ser Santos

“Todos os relatos do chamado dos santos têm muito em comum. Comparemos, por exemplo, o chamado de Jeremias em (Jeremias 1.4-12) e o chamamento de São Paulo segundo a memória do relato de São Lucas (Atos dos Apóstolos 9). Mais marcantes são ainda as próprias palavras de São Paulo, escritas aos Gálatas (Gálatas 1.15-16): - ... Deus, em sua graça, me escolheu mesmo antes de eu nascer. E me chamou para servi-lo... para que eu anunciasse aos não-judeus as Boas Notícias e respeito dele...- Comparemos a palavra de Deus falada à Jeremias: - antes mesmo de te formar no ventre materno, eu te conheci; antes que saísses do seio eu te consagrei. Eu te constituí profeta para as nações. – Parece claro que o Apóstolo fora ensinado a ver-se em Jeremias; esta é uma norma comum na leitura das Escrituras. Se não for assim, perdemos as palavras que Deus fala aos seus servos, ali estão escritas. Também não faria sentido celebrar a festa da conversão de São Paulo, se não estivermos ouvindo o que Deus nos diz através dela, para a realização de nossa própria conversão. – Antes que saísses do seio eu te consagrei. - Os chamamentos de Jeremias e de São Paulo foram, os dois, simplesmente súbitos. As outras pessoas ficaram intrigadas ou perplexas pela violência da mudança. Aquele que até então perseguia agora prega, diziam de São Paulo. Mas não há um começo súbito sobre isto tal como se revela aos seres humanos neles de fato envolvidos. – ... antes mesmo de te formar no ventre materno, eu te conheci. O que eles experimentam foi uma retirada de todos os véus, o esclarecimento de todos os obstáculos entre duas coisas: uma destinação eterna e um campo de trabalho. Aqui estou eu, escolhido e predestinado (que Deus me ajude!) para anunciar sua vontade. Há ainda as multidões da humanidade, minha audiência destinada. Isto é tudo o que há. Isto, é tudo o que devo considerar. Jeremias não diz... EU, um profeta? Mas, Senhor, os profetas de Judá apodreceram: tomam chá com as esposas dos príncipes de Judá e dizem coisas suaves. Não há futuro em ser profeta... - São Paulo também não diz: - ... Eu, mestre de nações? Não. Eles sabem que se estão no atoleiro, devem arrancar suas rodas daí e se não há linguagem para alcançar seus ouvintes, deverão inventar uma. Esta é a tarefa. A única pergunta é, têm eles força para tanto? Ah! Senhor Iahweh, eis que eu não sei falar porque sou ainda uma criança: ... a quem eu te enviar, irás, e o que eu te ordenar, falarás. Não temas diante deles, porque eu estou contigo para te salvar, oráculo de Iahweh... Então Iahweh estendeu a sua mão e tocou-me a boca. E Iahweh me disse: Eis que ponho as minhas palavras em tua boca. Vê! Eu te constituo, neste dia, sobre as nações e sobre os reinos, para arrancar e para destruir, para exterminar e para demolir, para construir e para plantar. O profeta foi chamado quando o primeiro reino de Deus caía em ruínas, e o apóstolo foi chamado antes do novo reino que Deus mesmo antecipava. A tarefa pode ser tão pesada quanto a cruz, mas a alternativa é clara como a luz do dia... à ambos os benditos santos dos dois Testamentos, Jeremias e São Paulo.

Austin Farrer
Words for Life, editado por Charles Conti e Leslie Houlden, SPCK, Londres 1993, página 53

01 novembro 2008

1 e 2 de Novembro de 2008 • Festival (e oitava) de Todos os Santos e Dia de Todas as Almas

Leituras

Profecia de Neemias 2.1-10
Salmo 40
Apocalipse de São João 6.12
Evangelho de São Mateus 13.24-30


Todos os Santos

Vou contar uma estória que nos vem do tempo ainda logo após a vida de Jesus. Alguns pagãos importunavam duas meninas judias, rindo delas por causa de sua religião. O que poderia ser mais absurdo que a ressurreição? Como pode uma pessoa que literalmente apodreceu e se transformou em pó, viver e respirar novamente. As duas meninas cochicharam por alguns instantes. Então, disse uma delas: Posso contar a vocês um caso, por favor? - Vão em frente, disseram eles. Em nossa aldeia, disse uma delas, havia dois oleiros. Um deles fazia vasilhas a partir de água e barro. Já o outro, as fazia a partir da água somente. Qual deles, segundo vocês, era o mais surpreendente em sua habilidade? - Ora vocês estão dizendo bobagens; mas se tais homens existissem, aquele que fabricava vasilhas a partir da água somente, este seria o mais admirável. – Então, perguntaram elas, como é que vocês mais se surpreenderiam – se Deus fizesse algo novo a partir do pó ou se começasse tudo... só a partir de uma gota de água, desde o início?

Entendo que não há muito acrescentar, mesmo pela mente mais brilhante, à este argumento infantil. Se cremos mesmo em Deus, cremos em um criador que, por sua vontade e poder, gerou todas as coisas, os seres humanos inclusive, não a partir de uma gota de água, mas simplesmente a partir do nada. Ele agora nos refaz, e tem pelo menos a matéria prima; mesmo que o meio como Ele trabalha em nós seja mistério absoluto. De qualquer forma, seria uma forma de fé muito estranha – que permitisse a Deus ter tanto poder para criar todas as coisas – e negar seu poder para criar tudo o que existe, e ainda mais, negar a Ele o poder de recriar a pessoa humana.

O Festival de Todos os Santos não concerne principalmente aqueles que muito particularmente viveram vidas santas aqui na terra, mas àqueles a quem o poder de Deus refez e conduziu ao céu. Crer na existência real desta grande companhia não é o mesmo que crer na existência da alma imortal: é crer em Deus e em sua vontade de nos salvar em vida e aproximar-nos de si próprio. Os santos foram feitos por Deus na sua criação, e por Ele são também refeitos em sua existência celestial. Mas ainda mais, foram feitos o que são pela graça celestial. Deus não só lhes deu existência, deu-lhes também santidade; e é por isso que temos comunhão com eles, e estamos reunidos na comunhão dos santos. O amor divino que neles triunfou também nos conquistará. Se queremos saber o que Deus está fazendo conosco, olhemos para estes seres esplêndidos que partilham da espontaneidade da mente do Criador, da alegria de seu coração e do hálito de seu amor. A religião não é fundamentalmente uma batalha contra o pecado mas uma elevação e reunião à glorificação. Deus nos eleva através de Jesus Cristo, e à Cristo através daqueles que vieram antes de nós, ou que nos acompanham. Cremos, nem todos os que deixaram esta vida terrena já alcançaram a existência celestial e, assim, quando nos regozijamos em todos os santos durante estes dias, continuamos rezando também por todas as almas, especialmente pelos amigos que conhecemos, para que Deus os reúna aos seus santos, por Jesus Cristo.”


Austin Farrer, Homilia para o Festival de Todos os Santos, página 21 de Words for Life, editado por Charles Conti e Leslie Houlden – SPCK, Londres 1993

NOTA: “Austin Farrer, nas palavras de um teólogo proeminente – foi o maior dentre os pensadores Anglicanos em sua geração, reputação que se mantém mesmo após sua morte em 1968. Teólogos e filósofos o reconhecem como uma das mentes mais brilhantes na Oxford de seu tempo. Um escritor, trabalhando o perfil de Farrer, declarou que ele conseguiria que um ateu de verdade... desejasse a fé verdadeira. Helen Oppenheimer, colega de Farrer, escreveu em seu The Hope for Happiness que o século 20 não ficou vazio de profetas. Ela incluía Farrer ao lado de Teilhard de Chardin e Karl Barth. É bom agora lembrarmos de Farrer “feliz no Senhor”, celebrando a alegria ilimitada do pensar teológico. Os sermões de Farrer resistem ao teste do tempo. Eles testificam a sensibilidade de um homem que combinava compromisso e contentamento.”

Prefácio por Charles Conti, Universidade de Sussex

26 outubro 2008

Domingo 26 Outubro de 2008 • Trindade XXIII

Leituras

Êxodo 22.20-26
Salmo I
I Carta aos Tessalonicenses 1.5-10
Evangelho de São Mateus 22.34-40



Corações que Deus tocou

“O tempo todo, para aqueles cujo coração Deus tocou, permanece a tarefa suprema de levar ao Seu povo mesmo, em Sua majestade, Sua compaixão, Sua vontade sobre a humanidade, o ofertório admirável de si mesmo em Jesus, o Verbo feito carne.

Não podemos cumprir com esta tarefa a menos que lutemos por cumpri-la no mundo todo. Isso exige o serviço de mulheres e homens prontos a se encaminhar a toda parte na obediência a Cristo, e que testemunhem Seu amor através da insistência de que raças, brancos e negros são irmãos da mesma dignidade.

Nossa missão como Igreja implica em constante envolvimento na comunidade. Devemos aproximar-nos tanto como aprendizes quanto como mestres. Precisamos aprender não só muitas técnicas novas mas perceber também o que Deus está falando nas circunstâncias novas e desafiadoras de nosso tempo.

Como é a Deus a quem testemunhamos, precisamos também de constante desprendimento, vontade de afastar-se para esperar quietos em Deus, em silêncio, a menos que, por nosso próprio trabalho percamos, para nós e também para os demais, a compreensão da presença de Deus: Aquietai-vos e sabei que eu sou Deus.

Todo coração que Deus tocou deve guardar tempos de quietude em meio à vida ocupada e barulhenta que sofremos, para que Ele toque nossos corações sempre de novo.”

Arcebispo Michael Ramsey
Gateway to God
Editado por Lorna Kendall
Darton, Longman and Todd, Londres 1988

19 outubro 2008

19 de Outubro de 2008 • Trindade XXII

Leituras

Profecia de Isaías 45.1. 4-6
Salmo 96
I Carta aos Tessalonicenses 1.1-5
Evangelho de São Mateus 22.15-21



Abertura ao Mundo

“Dada a ausência de abertura ao mundo contemporâneo a teologia tem por vezes trabalhado como que em um vácuo, sem riqueza de sentido em si mesma e sem poder de comunicação.
A abertura ao mundo deve ser sempre acompanhada por uma abertura ao Cristo crucificado ou, de outra forma, a sabedoria do mundo pode orientar mal.
A necessidade implica quatro espécies de abertura – para o passado e para ao presente, para o mundo e para o céu e eternidade.
A abertura para o céu será nula e vazia, a menos que traga consigo a abertura para o mundo ao nosso redor.Com as decisões diárias e com os relacionamentos do mundo, encontramos Deus, e aprendemos o sentido de nossa teologia em termos humanos.
Aqueles que tentam isolar a cidade secular de seu passado e também da eternidade, perdem a dimensão em que as vidas humanas recebem o sentido último e ainda, não menos, a perspectiva em que as necessidades da cidade secular precisam ser apropriadamente consideradas.”


Arcebispo Michael Ramsey
Gateway to God
Editado por Lorna Kendall
Darton, Longman and Todd, Londres 1988

12 outubro 2008

12 de Outubro de 2008 • Trindade XXI

Leituras

Profecia de Isaías 25.6-10
Salmo 23
Carta aos Filipenses 4.12-14, 19-20
Evangelho de São Mateus 22.1-14


O Papel dos Cristãos no Mundo

“Somos chamados como cristãos à uma fé que - tanto se compromete intensamente com este mundo, como guarda bem presente a realidade além dele.
O primeiro é, em verdade, um teste imediato para a fé cristã. Nossa preocupação e ação pelos famintos e sem teto, pela justiça nas relações entre as diferentes raças, pelas leis de conduta que Deus nos alcançou, mostram se amamos o Deus a quem não vemos, através da prova do amor pelo próximo a quem vemos.
Mas, ao servir este mundo e suas necessidades estamos, em verdade, tomando em mãos algo além dele, uma vida eterna que dá a este mundo sua perspectiva verdadeira. Isto não pode ser esquecido.
Não estamos aqui somente para fazer coisas, estamos aqui para ser algo, nos tornarmos algo – é este o chamamento para sermos santos. A fé cristã consiste em fazer coisas aqui, mas é também uma fé cujo alvo está além daqui.
Os cristãos estão no mundo como a alma no corpo, mantendo viva para si próprios e para os outros, a esperança do Céu.

A isto Ele nos tem chamado e nos unifica a todos os que, em toda parte, têm também a mesma vocação e não ousam olhar para trás.”

Arcebispo Michael Ramsey
Gateway to God
Editado por Lorna Kendall
Darton, Longmann and Todd, Londres - 1988

05 outubro 2008

5 de Outubro de 2008 • Trindade XX

Leituras

Profecia de Isaías 5.1-7
Salmo 80
Carta aos Filipenses 4.6-9
Evangelho de São Mateus 21.33-43



SANTIDADE

“A noção de santidade encontra uma ênfase nova na Igreja primitiva. Na nova aliança o papel de - nação santa – recai agora sobre os cristãos; eles são a ecclesia de Deus, eles são chamados a ser santos, raça eleita, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus. (I Carta de São Pedro 2.9)

O uso de hoi hagioi, os santos, como descrição normal dos cristãos, suscita a ênfase nova e assombrosa da santidade na fé cristã.

Assim, a vida no Espírito é santidade.

Sendo santa pelo chamado de Deus e em Espírito de santidade, a Igreja cresce na mesma direção da santidade de Cristo.
Unidade, santidade e verdade: como a oração de nosso Sumo sacerdote é indivisível, indivisível é também seu cumprimento.
De nada adianta pensar que podemos buscar por unidade em nome de Cristo a menos que olhemos também pela santidade na Sua obediência, e pela compreensão da verdade que Ele revelou.

O tempo todo, Cristo o Cabeça da Igreja prossegue em Sua misericórdia usando a Igreja, por mais dividida que esteja, para firmar Sua própria verdade e unidade, além de conduzir a muitos no caminho da santidade.

Arcebispo Michael Ramsey
Gateway to God
Editado por Lorna Kendall
Darton, Longman and Todd, Londres 1988

28 setembro 2008

28 Setembro 2008 • Trindade XIX

Leituras

Profecia de Ezequiel 18.25-28
Salmo 25.1-14
Carta aos Filipenses 2.1-11
Evangelho de São Mateus 21.28-32


O Sofrimento e as Circunstâncias Transfiguradas

“O – Pai Nosso – acolhe as necessidades e os conflitos dolorosos da humanidade elevando-os ao Reino e ao Pai mesmo. A Transfiguração é realmente um tema central para a Fé Cristã... a transfiguração dos sofrimentos e das circunstâncias de mulheres e homens, com a visão de Cristo diante deles e o Santo Espírito em seu interior.
A transfiguração do sofrimento é atestada na vida cristã. Por vezes, alguém pode sofrer intensamente, o sofrimento persiste e não desaparece; pela proximidade de Cristo no entanto, uma coragem se torna visível, bem como amor e simpatia crescentes, poder de oração e uma encantadora espécie de semelhança com Cristo.

As circunstâncias são transfiguradas. Algo bloqueia o seu caminho, um fato da vida, pessoa ou obstáculo, particularmente tortuoso ou frustrante. Parece ser impossível removê-los, ignorá-los ou vencê-los. Mas, quando vistos num contexto mais amplo, e este contexto é Jesus Cristo crucificado e ressurreto, surgirá aí uma nova órbita de relacionamentos e, embora permaneçam os obstáculos, eles têm uma continuidade bem diferente. A expressão de São Paulo parece interpretar a experiência, quando ele contrasta nossa – leve aflição – com o – impressionante - peso da glória, - um pertencente ao tempo, e o outro, pertencente à eternidade.
Assim é a transformação das circunstâncias, não por sua abolição mas pelo ofertório delas todas à órbita de Jesus crucificado e ressurreto.”

Arcebispo Michael Ramsey
Gateway to God
Editado por Lorna Kendall
Darton, Logman and Todd, Londres 1988

21 setembro 2008

21 de Setembro de 2008 • Trindade XVIII

Leituras

Profecia de Isaías 55.6-9
Salmo 145. 1-8
Carta aos Filipenses 1.20-24, 27
Evangelho de São Mateus 20.1-6



Alegria

“Alegria no Senhor. Qual é mesmo esta alegria?
É a alegria daqueles que, aconteça o que acontecer, começam a conhecer Deus, a amá-lo em sua beleza e ternura e se expõem à sua Presença.
Não é somente a alegria de uma fé certa onde Deus reina supremo; é a alegria de uma comunhão prática com Aquele que é Ele mesmo alegria, e que derrama alegria às vidas a Ele unidas.
Nossa alegria é a alegria daqueles que são perdoados e perdoam. Esqueçamos ou desdenhemos as realidades da penitência e do perdão em nossas vidas e não será surpresa que a alegria que é nosso privilégio comece a dissipar-se.”

Arcebispo Michael Ramsey
Gateway to God
Editado por Lorna Kendall
Darton, Longman and Todd, Londres 1988

14 setembro 2008

14 de Setembro de 2008 • Trindade XVII

Leituras

Livro de Eclesiástico 27.30-28.7
Salmo 103
Carta aos Romanos 14.7-9
Evangelho de S. Mateus 18.2135


Obediência

“Nós somos servos, chamados à obedecer.
A noção de obediência parece ter como que derrapado de nossa vivência contemporânea da fé. Cogitamos bastante sobre as respostas da fé, amor, filiação, comunhão na relação com Deus ou com nosso Senhor. Mas obediência? Tendemos a imaginar que cheira a legalismo, nada que nos deva prender muito.
O fato é que a obediência tem um espaço inarredável no Novo Testamento. Jesus foi – obediente até a morte – (Filipenses 2.8), e - Ele aprendeu a obediência através do que sofreu – (Hebreus 5.8)
O Apóstolo é escravo de Cristo
Nossa obediência implica em – lombos cingidos.
Lombos cingidos – sugerem uma condição de alerta pronta a enfrentar emergências e interrupções. Não se sobrecarreguem. Estejam prontos a se mover, com rapidez e presteza. Nossa fidelidade é sempre de novo testada pelo poder para lidar com as rupturas. Você planeja seu dia conforme um dado plano e algo súbito desarruma tudo.

Se a vontade de Deus é a de que você aceite esta ou aquela quebra, aceite-a com alegria. Então, um dia que pareceria tempestuoso será em verdade reto, de paz e ordem; pois aí onde a vontade de Deus está, há também a presença de Deus e Sua paz, e onde Sua Presença é obedecida... há padrão e harmonia. Em sua vontade reside nossa paz.”
Arcebispo Michael Ramsey
Gateway to God
Editado por Lorna Kendall
Darton, Longman and Todd
London 1988

07 setembro 2008

7 Setembro 2008 • Trindade XVI

Leituras

Profecia de Ezequiel 33.7-9
Salmo 119.33-40
Carta aos Romanos 13.8-10
Evangelho de S. Mateus 18.15-20

Coisas Inabaláveis: a vida religiosa

“Ao longo dos séculos Cristo tem chamado muitos para a vida religiosa através do voto tríplice de pobreza, castidade e obediência. Aqui, estamos diante de um espaço intensamente evangélico da Fé Cristã bem enraizado na tradição do Evangelho.
Quanto aos votos religiosos, nada há aí de presunçoso. Os votos na fé significam a aceitação total do chamamento de Deus e o dom proveniente de Deus mesmo – uma aceitação – pela fé somente – e – pela graça somente. À Deus seja toda a glória.
Talvez, em nenhum outro tempo a vida religiosa tenha sido mais significativa para o Cristianismo e para o mundo que em nossos dias. Se Deus chama e dispõe os dons, o chamamento e os dons são verdadeiros e válidos em si; eles vêm de Deus; aí, somos capazes de ver como o chamado de Deus e seus dons podem responder aos problemas e necessidades de diferentes pessoas e diferentes épocas em nossa história.

Quanto à vida religiosa em comunidade. Aqui, sua permanência e estabilidade têm algo a dizer, têm um sentido.
Afirma-se a permanência da vocação em seus membros, mas também um testemunho à coisas que não se deixam abalar, verdades e ideais que não pertencem a uma área ou época em particular, mas que atravessam os séculos, como uma escada cujo topo alcança o Céu.”

Arcebispo Michael Ramsey
Gateway to God
Editado por Lorna kendall
Darton, Longman and Todd, Londres - 1988

31 agosto 2008

31 de Agosto de 2008 • Trindade XV

Leituras

Profecia de Jeremias 20.7-9
Salmo 26.1-8
Carta aos Romanos 12.1-2
Evangelho de S. Mateus 16.21-27

Aquietai-vos e sabei: a oração de contemplação

“Há sinais de redescoberta do espírito contemplativo, graças à compreensão de que a contemplação é exposição ao amor divino, tão poderoso em seus efeitos sobre a vida humana.
O efeito da contemplação não é tanto o de criar na pessoa um anseio maior ainda por tal experiência mas o de maior amor e mais vontade de servir sob a soberania de Deus revelada em Jesus. Na verdade, a validade da contemplação é muitas vezes testada pela busca da vida da fé.
A oração e a vida cristãs são descritas, tanto por São Paulo como por São João como profunda habitação de Deus e Jesus nos cristãos, antecipação da glória da parousia. Não estamos muito longe da contemplação, quando lemos - se alguém me ama guardará minha palavra e meu Pai o amará, e ambos viremos para nele fazer habitação.”


É muito importante para a renovação da Igreja cristã que a vocação contemplativa seja mais conhecida e redescoberta. É importante para nós todos, qualquer que seja nossa forma de culto, pois somos todos uma só família. Assim como ela nos ajuda na vida do dia a dia, ao ponto de que mártires dão suas vidas por Cristo, assim nos ajuda também em nossa pobre oração, suscitando aqueles que conhecem a Noite Escura e têm Deus mesmo derramando-se sobre suas almas.”

Arcebispo Michael Ramsey
Gateway to God
Editado por Lorna Kendall
Darton, Longman and Todd – Londres - 1988

24 agosto 2008

24 de Agosto de 2008 • Trindade XIV

Leituras
Profecia de Isaías 22.19-23
Salmo 138
Carta aos Romanos 11.33-36
São Mateus 16.13-20



Intercessão



“A Igreja é chamada como comunidade que fala ao mundo em nome de Deus e que fala à Deus a partir da escuridão e frustração do mundo. O que se chama – intercessão de Jesus - é Sua presença incessante junto ao Pai. Ele permanece com o Pai, não como alguém implorando para que o Pai seja bondoso... já que do Pai a graça sempre flui.
Aproximar-se do Pai através de Jesus Cristo, o Intercessor, é buscá-lo com a consciência do custo de nossa redenção pelo sacrifício feito de uma vez por todas – e por uma vitória conquistada de uma só vez – sacrifício e vitória - são ambos história passada e realidades sempre presentes. É isso que ao mesmo tempo capacita e caracteriza nossa resposta a Deus por Jesus Cristo.
Interceder é ter os outros no coração, buscando a presença de Deus. Nossos próprios anseios têm também seu lugar. Está claro pelo ensino de Jesus, que Deus quer que a Ele digamos nossas súplicas.
Quando, no entanto, nós o fazemos – em nome de Jesus – aprendemos a submeter
nossas vontades ao discernimento do querer divino. A intercessão assim não se torna um bombardeio a Deus, com multidão de pedidos... mas um ofertório das nossas súplicas ao caminho da compaixão mesma de Deus.”


Silêncio

“O silêncio permite que nos conscientizemos da presença de Deus, deixando que a mente e a imaginação repousem sobre a Sua vontade, que a oração seja ouvida mesmo antes de ser falada, revelando nosso próprio eu de uma forma que nem sempre é possível quando nos comportamos ruidosamente ou somos envolvidos pelo barulho. Por vozes ocorre o silêncio interior, no qual a alma se descobre em uma nova dimensão de energia e paz, uma dimensão que a vida inquieta não conhece.
Um mundo assustador em seus ruídos e em sua velocidade é um mundo onde só o silêncio pode reforçar a verdadeira liberdade.
O tempo de silêncio permite ao cristão partilhar mais profundamente na adoração sacramental da Igreja. À prática cristã do silêncio, nos abre a maravilha de Deus o Criador, a memória da vida, morte e ressurreição de Jesus, a recordação de cenas da Sua vida, passagens da Escritura, glórias da natureza em que o dedo de Deus está presente, bem como a gratidão pelas bênçãos pessoais ou por palavras dos poetas... que cantam o encanto e a beleza.”

Arcebispo Michael Ramsey
Gateway to God
Editado por Lorna Kendall
Darton, Longman e Todd, Londres 1988

17 agosto 2008

17 de Agosto de 2008 • Trindade XIII

Leituras
Profecia de Isaías 56.1, 6-7
Salmo 67
Carta aos Romanos 11.13-15, 29-32
Evangelho de São Mateus 15.21-28



Peregrinação a Lindsfarne

“Em poucas horas mais e a maré estará baixa. Retornaremos então para casa, de volta às tarefas domésticas, nossas paróquias e igrejas. Filhos e filhas, tomem com vocês a lição suprema desta ilha santa: levem-na consigo. A lição suprema é a de que nossos pais aqui vieram porque sabiam que, se almas devem ser ganhas, primeiro deve vir o chamado à oração, na quietude e distância da agitação da vida do mundo. Levem isto de volta com vocês.
Sacerdotes, coloquem antes de tudo a oração: sejam homens de Deus: sejam intercessores. Sigam a Cuthbert que, - ao oferecer os santos mistérios se oferecia a si próprio como sacrifício à Deus, com lágrimas de contrição.
Povo, guardem silêncio no tempo da oração: usem suas igrejas para a oração quieta e silenciosa – e o céu ficará mais próximo. Levem isto de volta para casa, esta foi a única coisa que Maria escolheu como necessária.
Nossa glória, filhos, está em nossos pais: recordem sempre deles: agradeçam a Deus por eles: imitem sua fé. E o propósito poderoso de Deus se moverá à frente, e em lugar de nossos pais estarão nossos filhos, príncipes e princesas de Cristo em nossa própria terra.”


A Oração Mais Simples

“Ninguém está tão perto de Deus quanto aquele que tenha tal anseio – por menor e mais inarticulado que seja. É aí que a oração pode começar, a oração por sermos nós mesmos em profunda sinceridade.
Podemos rezar assim: Ó Deus anseio por Ti, eu Te quero, ajuda-me a querer-Te ainda mais. Ó meu Deus, eu te amo tão pobremente, ajuda-me a Te amar como Tu me amas. Ó meu Deus, mal consigo confiar em Ti, aumenta minha fé. Ó meu Deus, em verdade não me entristeço por meu pecado: mas quero, dá-me verdadeira tristeza por ele.
Não encontramos a Deus só por tentar ser mais religiosos que o que somos ou podemos vir a ser.
Não, estaremos mais próximos de Deus tentando ser nós mesmos, e aí Ele poderá começar a encontrar-nos, preenchendo nosso vazio, e assim também, algumas das antigas expressões da religião poderão ficar mais próximas do que temos no coração.”

Arcebispo Michael Ramsey
Gateway to God
Editado por Lorna Kendall – Darton, Longman and Todd, Londres 1988

09 agosto 2008

10 de Agosto de 2008 • Trindade XII

Leituras
I Reis 19.9, 11-13
Salmo 29
Romanos 9.1-5
São Mateus 14.22-33

Deus é Amigo dos Homens

“Deus é amigo dos humanos, e em todas as trocas entre Deus e os homens Ele será sempre aquele que mais concede, dando tanto que o que é oferecido por nós parece quase nada, tênue e microscópico.
Este é o sentido do Natal, da Sexta-feira da Paixão e da Páscoa – Deus dando-se a si mesmo em ofertório generoso à humanidade, aproximando-se de nós, conosco, e em nós muito além da imaginação.
Deus e nós; sim, Deus e nós, juntos, em maravilhosa proximidade.
Quando rezamos não bombardeamos a Deus com nossos desejos. Começamos muito mais próximos dEle, participando de Seu coração e Sua mente, dispondo nossa vontade à Sua disposição para servir ao Seu bom propósito para com este mundo.”


O Propósito de Deus

“O propósito de Deus é como um fluxo de bondade alcançando o mundo e todas as suas necessidades. Mas é nosso privilégio como filhos de Deus ajudar este Seu curso no sentido de alcançar outras pessoas, tornando-se, elas mesmas, canais. Nossas boas ações podem ser canais da bondade de Deus e assim também, nossas orações.
Não é isto que Jesus nos ensina ao alcançar-nos o Pai Nosso, como modelo de oração? Jesus não diz somente – rezem com estas palavras – mas –
rezem com esta seqüência de pensamento e desejo...
Quando dizemos que Deus nos ama, afirmamos que Ele cuida de cada um de nós como não houvesse ninguém mais necessitando de seu cuidado; ele cuida de ti na individualidade mesma que és. Ele quer a ti, para estar com Ele para sempre, para repartir contigo tudo o que Ele tem para partilhar.
Isto é o Céu.
É a perfeição da relação entre Deus e os humanos. Não pode ser algo egoísta de forma alguma já implica no que é plural, e o céu inclui o amor e serviço mútuo de todos os que dele partilham, amor e serviço totalmente integrados com o amor e a visão de Deus.”

Arcebispo Michael Ramsey
Gateway to God
Editado por Lorna Kendall
Darton, Longman and Todd, 1988

03 agosto 2008

Domingo 3 de Agosto de 2008 • Trindade XI

Leituras

Profecia de Isaías 55.1-3
Salmo 78.1-29
Carta aos Romanos 8.35,37-39
Evangelho de São Mateus 14.13-21

A Liturgia da Palavra
“Embora a nova possibilidade do acesso ao Pai por Jesus em um Espírito, oportunizado pela nova aliança, a adoração da nova ecclesia tem uma continuidade real com a adoração da antiga. É o mesmo Deus de glória que é adorado.
Na nova ecclesia as Escrituras da antiga ecclesia são acolhidas como Santas Escrituras, pois se mostram agora falando de Cristo e sua glória. Dentre as Escrituras, o Saltério tem um lugar especial.
O Saltério é usado na Igreja por duas grandes razões:
1 – O Saltério é a voz do Israel de Deus, adorando agora como o fazia com o Criador antigamente, Rei e Redentor, orando pela vitória sobre seus inimigos que não são menos mortíferos justamente por serem espirituais, sutís e invisíveis.
2 – O saltério faz parte do livro de orações de Cristo mesmo. Em seu uso dos Salmos as expressões de adoração, súplica e compromisso, além de dedicação, alcançaram um final perfeito.
Ao usar o Saltério em nome de Cristo os membros do Corpo fazem suas as orações do Cabeça mesmo da Igreja.
Jamais tenhamos nós uma só geração de adoradores não familiarizada com os Cânticos e com os Salmos!

A Liturgia da Eucaristia

A Eucaristia é a forma suprema pela qual o povo de Cristo está, através de nosso Sumo Sacerdote, com Deus e com o mundo todo em seus corações.
O autor e agente da Eucaristia é o Verbo de Deus. O Verbo é proclamado nas leituras da Escritura e na pregação. Então, o Verbo Jesus abençoa o pão e o cálice, nos convida e envia.
Jesus, o Verbo, nos nutre para que possamos sempre mais crescer em Seu próprio Corpo neste mundo, partilhando com Ele no trabalho da re-criação do mundo. Não somos nutridos para nos refugiarmos com Ele em uma espécie de espaço da religião mas para sermos conduzidos com Ele, no trabalho de moldar o mundo à sua própria semelhança.
O sentido de toda vida está aí estabelecido, uma vez que os humanos foram criados para adorar a Deus.
Como a Encarnação, a Eucaristia consiste na irrupção, na história, de algo eterno, além da história, algo impossível de ser apreendido em termos históricos somente.
A questão suprema não é a do que fazemos da Eucaristia mas o que ela faz de nós ao, (juntamente com o Verbo), nos conduzir ao caminho de Cristo.

Arcebispo Michael Ramsey
Gateway to God
Editado por Lorna Kendall
Darton, Longman and Todd, 1988

26 julho 2008

27 de Julho de 2008 • Trindade X

Leituras

I Livro de Reis 3.5, 7-12
Salmo 119.129-136
Carta aos Romanos 8.28-30
Evangelho de São Mateus 13.44-52



Jesus: a Escada da Oração Cristã

“A oração cristã significa não só a Oração do Senhor mas Oração do Senhor e o Senhor mesmo. O crente que reza é alguém cuja oração é unicamente sua, um movimento divino e humano dentro de sua própria alma e em lugar algum mais; e como duas pessoas nem mesmo são iguais, também a oração de cada uma será diferente. Mas, por solitária que seja a oração, ela está sempre entrelaçada com a oração de Jesus, com a oração interior do Santo Espírito e com a oração da família orante, a Igreja em todo lugar.
A oração cristã é, em verdade, uma escada cujo topo alcança o céu.
Mas a escada da oração cristã não só alcança o céu e repousa firmemente sobre a terra. Mais que isto, ela une céus e terra muito de perto, porque a escada é Jesus, o Senhor Encarnado.
Nele e por Ele participamos nas orações e louvores dos santos benditos no céu. Nele e por Ele, tocamos, com nossas orações os pecados e tristezas da humanidade. Nele e por Ele nossas orações serão unas, também nEle, como Ele está no Pai pelo vínculo do Santo Espírito.”

A Adoração Litúrgica

Se a Oração do Senhor e a expressão – por Jesus Cristo – forem interpretadas à luz do Novo Testamento, então a oração cristã não é primordialmente mística ou profética em sua essência, mas litúrgica. É a participação dos humanos na ação única de Cristo, morrendo em seu próprio egoísmo humano, da mesma forma como são reunidos em um só Corpo em sua morte e ressurreição.
O movimento regular e ordenado da Liturgia não é um despropósito ou acúmulo à oração cristã; antes, expressa o fato neo-testamentário da adoração como a ação divina, na qual toda oração oração espontânea e congregacional sempre mergulham.
Sendo assim, a comunidade que construimos em nossas paróquias é uma comunidade entre nós que vivemos sobre a terra e a Igreja no paraíso e no céu. Esta dimensão de comunidade sempre precisa de constante ênfase, e de uma expressão litúrgica ainda mais plena, tal como a encontrada no Primeiro Livro de Oração do Rei Eduardo VI. Felizes são os aqueles cujas igrejas estão plenas da lembrança de que a Igreja sobre a terra é uma colônia do céu, e que aqueles que são chamados a serem santos já têm comunhão com os santos na glória.”

Arcebispo Michael Ramsey
Gateway to God
Editado por Lorna Kendall
Darton, Longmann and Todd, Londres, 1988

20 julho 2008

20 de Julho de 2008 • Trindade IX

Leituras

Livro de Sabedoria 12.13, 16-19
Salmo 86
Carta aos Romanos 8.26-27
Evangelho de São Mateus 13.24-43



A Oração de Jesus

“É tranqüilo afirmar que a Oração de Jesus, bem cedo, foi integrante íntima do seu trabalho naquele mesmo dia. Para Jesus, bem como para os discípulos, a oração é da essência mesma do trabalho de Deus.
No Calvário, Mateus e Marcos contam só da oração de desolação. Lucas, cujo relato suaviza o senso de solidão ao referir a compaixão de Jesus para com os que dele se aproximam, registra outras orações de Jesus no Calvário. Jesus reza pelos soldados que o crucificam, encomendando-os à compaixão do Pai: - Pai, perdoa-lhes; pois eles não sabem o que fazem -. (S. Lucas 23.34)
Finalmente, omitindo o clamor de desolação, Lucas fala de Jesus, em sua morte, entregando-se ao Pai: - Pai, nas tuas mãos entrego meu espírito.
Obediência ao Pai, ação de graças ao Pai, intimidade com o Pai marcaram a missão de Jesus desde o começo até o fim.
Esta é a oração de Jesus em sua vida sobre a terra, conforme as tradições descritas nos primeiros três Evangelhos. Sua oração é a súplica daquele que é profundamente uno com o Pai e que, ao mesmo tempo partilha das frustrações da humanidade.”

A Oração do Senhor

“Na Oração do Senhor o sentido todo do orar está implícito. Mas ela não pode ser compreendida em separado do Seu ensino e ministério. Sua significação se desdobra na medida em que Jesus se move no trabalho dentre os homens; aí, e acima de tudo em sua morte e ressurreição, está revelado o sentido das palavras em torno das quais se centra a oração – O Pai, o nome, o Reino, a vontade.
As palavras chave da Oração do Senhor nos confrontam com um quadro do trabalho todo de Jesus Cristo. Para rezar a Oração do Senhor precisamos deixar a Galiléia e ir até Jerusalém, onde vemos o nome do Pai, seu Reino e sua vontade expressos na paixão.
A base da oração cristã não é a Oração do Senhor somente, mas a Oração do Senhor e o Senhor mesmo. A oração em seu nome significa rezar por de tudo o que Ele é e tudo o que fez..
Assim, se queremos rezar corretamente a Oração do Senhor, devemos usá-la à luz de sua interpretação no conjunto do Novo Testamento.”

Arcebispo Michael Ramsey
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Editado por Lorna Kendall
Darton, Longman and Todd, Londres, 1988

13 julho 2008

13 de Julho de 2008 • Trindade VIII

Leituras

Profecia de Isaías 55.10-11
Salmo 65
Carta aos Romanos 8.18-23
Evangelho de São Mateus 13.1-23

A Vida Humana Verdadeira

“Aquietar, ver, amar e louvar: estas palavras descrevem não só o alvo do céu mas a mensagem mesma da Fé Cristã neste mundo. O mundo perdeu de vista o caminho da quietude, da visão, do amor e do louvor. Mergulhado em atividade incessante o mundo não se aquieta para pensar. Sem descanso e sem meditar, o poder para ver é perdido: ver para onde vamos, perceber as perspectivas maiores, entrever além do grupo, nação ou raça, ver os seres humanos como eles realmente são, com a imagem de Deus neles impressa. Onde a visão é frágil, falece o amor; o louvor também se perde pois só louvamos se primeiro vimos e amamos. O ser humano perde o louvor por seu Criador, o sentido mesmo de sua existência, a fonte de seu descanso, de sua visão e de seu amor.
Se as palavras – descanso, visão, amor, louvor – falam tanto do céu quanto da vida humana verdadeira sobre a terra, não falam menos sobre a renovação da Igreja.
A renovação da Igreja significará descanso que se expõe à obscuridade e luz da contemplação, visão tanto da perspectiva celestial quanto das tristezas do mundo, amor que se dá por serviço custoso, e louvor que brota da profundeza da alma.”


O Louvor da Glória de Deus

“Deus declarou sua glória com o propósito de que a Criação inteira possa glorificá-lo. Quando os humanos glorificam a Deus, nada acrescentam à sua glória, eles somente a reconhecem.
O ato perfeito de adoração é unicamente visto no Filho do Homem. Por ele somente se dão o reconhecimento e a resposta perfeita da glória de Deus.
No centro da glorificação de Deus pela Igreja está o rito da Eucaristia. Aí a Igreja se une à glória de Cristo no Calvário e nos céus, e descobre o foco da glorificação de Deus por todas as suas criaturas.
Não devemos pensar que o Evangelho se fará simples para os mundanos e impenitentes. A tentativa de torná-lo simples, pode corrompê-lo ou entortá-lo, O Evangelho da glória de Cristo está sempre bem próximo da humanidade e, ao mesmo tempo, dela bem distante: perto, porque a imagem divina está na humanidade e o Evangelho é a significação verdadeira do ser humano; longe, porque é ouvido somente através da fé e do arrependimento... que derrubam toda auto-glorificação humana, de si mesma e de suas obras.”

Arcebispo Michael Ramsey,
Gateway to God
Editado por Lorna Kendall
Darton, Longman and Todd, Londres 1988

06 julho 2008

06 de Julho 2008 • Trindade VII

Leituras
Profecia de Zacarias 9.9-10
Salmo 145
Carta aos Romanos 8.9, 11-13
Evangelho de São Mateus 11.25-30

Pecado e Perdão

“Dentre todos os esforços pela cura das enfermidades humanas, freqüentemente há uma lembrança que fica em falta, a da dimensão do pecado e do perdão.
É esta dimensão do pecado e do perdão que o sacerdote mantém vivos pelo ofício que representa o perdão da Igreja e o do Senhor Jesus. Ele o exercerá pelo ministério da Confissão e Absolvição e também pela pregação do Evangelho da Reconciliação.
A fé dos discípulos falhou e foi restaurada à uma nova profundidade. Pode mesmo acontecer que a resposta do Pai à oração de Jesus permitisse que a lealdade dos discípulos falhasse, na certeza de que, através do fracasso, se libertassem da auto-confiança e assim se juntassem à fé que é a verdadeira morte para o eu.
Se a teologia deseja evitar os perigos de uma falsa secularização, a salvaguarda segura está em manter em seu âmago mesmo as atitudes essenciais da criatura para com o Criador, do pecador para com o Salvador. É quando perdemos a atitude de adoradores, de assombro e reverência na presença do Outro, e quando cessamos de pedir por perdão por nossos pecados, que o limite é ultrapassado. É aí que encontramos a crise do cristianismo secular.”

Return of the Prodigal Son - Rembrandt

A Confissão Sacramental

Na Absolvição, o sacerdote participa, por um lado, do coração quebrantado, no pecado e na penitência, e por outro lado, na tristeza e alegria de Cristo que toma sobre si os nossos pecados e os perdoa.
Todo sacerdote deveria conhecer o suficiente de psicologia para perceber o quanto conhece pouco, e assim reconhecer as instâncias em que deve aconselhar a procura pela psiquiatria. Mas há muitas ocasiões em que o sacerdote efetivamente pode ajudar o penitente por seu conhecimento da espiritualidade ao lado da sabedoria prática e da compaixão.
Muitos podem entender que o sentido da confissão sacramental muda para eles com o passar do tempo. Uma primeira confissão pode ser uma ocasião de percepção muito vívida da Cruz e também se mostrar como um momento de transformação na profundidade espiritual. As confissões subseqüentes, nos primeiros anos, pode efetivamente ter esta vivacidade.
Aí pode seguir-se um tempo em que isto cessa e a confissão pareça ter só a dureza de uma disciplina insossa. É então que, vir à Confissão exige uma disciplina séria da vontade e que se pode encontrar agora, por novos momentos, a ternura do amor de Deus, quase oculta, como que sob os nossos fracassos. Descobrimos humildemente como pode Deus nos usar a despeito de nós mesmos. Assim, nossa humildade e confiança agradecida a Ele serão renovadas.”

Arcebispo Michael Ramsey, Gateway to God – Editado por Lorna Kendall – Darton, Longmann and Todd, Londres - 1988

28 junho 2008

29 de Junho de 2008 • Trindade VI

Leituras

II Livro de Reis 4.8-11, 14-16
Salmo 89.1-18
Carta aos Romanos 6.3-4, 8-11
Evangelho de São Mateus 10.37-42

A Comunhão dos Santos

Nossa compreensão mais profunda da Comunhão dos Santos depende não tanto do entendimento a respeito dos santos mas de nossa compreensão sobre a natureza da oração.
Se a oração for formatada por nossas necessidades e súplicas, podemos então resvalar para o entendimento dos santos como aqueles que respondem às nossas orações, ao nos alcançar certos favores. Se, no entanto, nossa oração for constituída antes de tudo por glorificar a Deus na procura por Sua vontade e por Seu reino, seremos erguidos acima de nós mesmos na companhia daqueles que no paraíso e no céu procuram pela glória e também a refletem.
Na família dos santos podemos pedir pelas orações daqueles que estão próximos da visão de Deus, e podemos rezar por todos os que estão na terra, no paraíso ou no céu. Mas não podemos esquecer que esta família inclui os fracos e os que ainda lutam, como nós mesmos, ou aqueles cuja santidade é tão tênue porque o mundo deles exige demais. Nossa oração olha tanto para os fracos quanto para os fortes e, se formos fiéis, alcançará a ambos, uma vez que a glória de Cristo é sempre uma com a agonia de sua compaixão. Isto é o que significa rezar – Creio na Comunhão dos Santos.

Por que mesmo estamos aqui?

Será que existe mesmo neste nosso mundo dividido e frustrado alguma pista, algum sentido, um padrão, alguma soberania, um caminho? A Fé Cristã responde: Sim, há uma pista, um sentido, um padrão, uma soberania, um caminho. Isto é o que se descreve na parábola de Jesus sobre o grão de trigo que morre para dar fruto. É assim que Deus conquista o mal. Onde quer que em nosso mundo existam vidas que assim vivam, aí haverá uma luz brilhando e refletindo a própria luz de Cristo, um caminho claro e luminoso.
Assim saudamos aos santos.
Não é fazer o bem neste mundo o que gera um santo; ele geralmente faz o bem, mas o mesmo também ocorre com muitos outros a quem jamais chamaríamos santos. Não, o santo é alguém que tem uma peculiar proximidade a Deus e torna Deus muito real e muito próximo das outras pessoas. Ele personifica a parábola do grão de trigo que cai sobre a terra e morre.
Os santos refletem Jesus no mundo. Eles respondem a indagação dos desesperados que se perguntam, Onde está a chave, Qual é o objetivo? Para o que é mesmo o mundo? Eles nos mostram porque que estamos aqui – pois a menos que o grão de trigo caia sobre a terra e morra... –
Por que foi o mundo criado? A Festa de Todos os Santos nos dá a resposta.

21 junho 2008

22 de junho • Tribdade V

Leituras

Profecia de Jeremias 20.10-13
Salmo 86.1-10,16-17
Carta aos Romanos 5.12-15
Santo Evangelho de São Mateus 10.26-33

O Santo Espírito

O Espírito, derramado no dia de Pentecostes, é dom de Jesus crucificado e exaltado. O Espírito, é o Espírito de Jesus. Esta é a revolução no conceito do Espírito que vemos na Igreja primitiva.Em Atos dos Apóstolos São Lucas expõe o nascimento da Igreja como o drama do Espírito Santo.
A Igreja existe pelo poder do Espírito Santo. Seja como comunidade, como corpo, como templo ou povo de Deus, ela não tem existência não ser pelo impacto do Espírito sobre as vidas humanas.
A renovação feita pelo Espírito na Igreja está ligada ao testemunho do Espírito à vida, morte e ressurreição de Jesus. O caminho da verdade pelo qual o Paráclito nos guia é sempre a vereda que é Cristo mesmo, o que acontece quando Ele toma os fatos de Cristo e os declara aos discípulos.
Custa caro invocar o Espírito, pois a glória do Calvário foi o preço da missão do Espírito e é o preço mesmo da renovação do Espírito. É à sombra da Cruz que em todos os tempos da história os cristãos rezam: - Vem, ó Santo Espírito.

Pomba do Espírito Santo, multicolorida, com fundo floral primitivo. Nadja Vilas Boas. Mosaico bizantino, acabamento polido

O Santo Espírito e o Mundo

O Espírito não é algo em si mesmo, ou uma pessoa em si mesma, ou uma entidade filosófica também em si; Ele significa que Deus está ativo no mundo.
Como a ação de Cristo na Igreja inclui o aquecer realizado pelo Espírito nas respostas dos crentes, assim a ação do Verbo no mundo incluirá o aquecer do Espírito nas respostas humanas.
A salvação do mundo é trabalho do Santo Espírito não só para produzir bondade nas vidas humanas e conduzi-las a reconhecer Deus como o autor da bondade, além de glorificar o Cristo.
Três questões são suscitadas pela relação do Espírito na ecclesia e o Espírito no mundo: as ciências, as religiões do mundo e a bondade nele difusa.
Cada uma destas questões clama pelo reconhecimento explícito do Verbo divino e do Espírito no mundo, bem como pelo reconhecimento de um Salvador divino sem o qual nem a ciência, nem a religião, nem a bondade, podem subir ao céu – pois o céu é a participação perfeita na glória da Deus através do Espírito.

Gateway to God, Arcebispo Michael Ramsey
Editado por Lorna Kendall, Darton, Longman and Todd, Londres - 1988

14 junho 2008

15 de junho • Trindade IV • Evelyn Underhill

Leituras

Livro de Êxodo 19.2-6
Salmo 100
Carta aos Romanos 5.6-11
São Mateus 9.36, 10.8


O Santo Espírito
Dom e Poder

Última Mensagem de Evelyn Underhill
15 de Junho de 2008
Aniversário do Seminário e 105 anos de nossa Educação Teológica no Brasil

“Desde o início a Igreja esteve segura de que as séries de eventos que concorreram para o final inevitável da Semana Santa resumem e expressam os segredos mais profundos da relação de Deus com os seres humanos. Isto significa que a fé cristã jamais poderá ser só uma religião agradável ou consoladora. É trabalho duro. Está preocupada com a salvação através do sacrifício e do amor em um mundo no qual, como agora podemos ver, o mal e a crueldade são crescentes. Seu símbolo supremo é o Crucifixo – o ofertório total do ser humano aos propósitos redentores de Deus.

Somos todos filhos de Deus e temos todos nossa parte a desempenhar em seu plano redentor; a Igreja consiste nas almas amorosas que aceitam este dever, com todos os seus custos. De seus membros é exigido que vivam, cada um em seu caminho, através dos sofrimentos o abandono da Cruz; isto, como a contribuição única que podem fazer para a redenção do mundo. Os cristãos, assim como seu Mestre devem estar prontos a aceitar o pior que o mal e a crueldade lhes possam fazer, além de vencer tudo isto pelo poder do amor.

Se sacrifício e entrega total ao propósito misterioso Deus é o que se espera de nós, Sua resposta a este sacrifício é o dom de poder. Páscoa e Pentecostes completam o Mistério Cristão ao mostrar-nos, primeiro nosso Senhor mesmo e então, seus apóstolos escolhidos cheios de poder - poder do Espírito – que transformou todas as situações com que se depararam. Este poder sobrenatural ainda é a herança de todo cristão, e nossa idéia de fé cristã será destorcida e incompleta a menos que confiemos assim. É somente este poder que pode suscitar a nova sociedade cristã da qual tanto ouvimos. Devemos rezar por ela; esperá-la, nela confiar, e assim fazendo, aos poucos estaremos mais e mais dela convictos.”
(1) Esta foi a última carta que Evelyn Underhill escreveu ao Grupo de Oração que dirigia, para a Páscoa, em 1941. Ela morreu dois meses mais tarde, na Festa de Corpus Christi.

Os Sete Dons do Espírito

“Os escritores místicos nos falam de certas qualidades que são tradicionalmente chamadas de – os sete dons do Espírito -; se estudarmos a natureza especial destes dons veremos que são nomes de marcas ou poderes interligados que trabalham unidos pela edificação e esclarecimento da personalidade toda – como a edificação da natureza humana à novos níveis, uma sublimação do seus instintos primitivos. O primeiro par destas qualidades que devem marcar nossa humanidade espiritual são chamados de Santidade e Temor. Por elas significamos o solene instinto de relação direta com uma ordem eterna, aquela seriedade e encanto que devemos sentir na presença dos mistérios do universo; o temor do Senhor que é o princípio da sabedoria. Destes, crescem os dons chamados Conhecimento, o poder de discernir os verdadeiros dos falsos valores, de escolher um bom caminho pelo mundo confuso e a Força, o forte controle central das diversas energias do ser: este talvez, o dom mais necessário de nossa distraída geração. – Pelo dom da força espiritual, - diz Ruysbroeck, o ser humano transcende todas as coisas de sua condição como criatura, além de possuir-se a si próprio, poderoso e livre. - Este certamente é um poder que devemos desejar para as crianças do futuro e a elas devemos alcançá-lo, se nos for possível.

Vemos que os primeiros quatro dons do Espírito governam o ajuste do ser humano em sua vida terrena: eles incrementam muitíssimo o valor da personalidade na ordem social, esclarecendo a mente e juízo, conferindo nobreza aos objetivos. Os últimos três dons – chamados como Conselho, Inteligência e Sabedoria – governam o relacionamento com a ordem espiritual. Por Conselho, os escritores místicos significam aquela voz interior que, na medida em que a alma amadurece, urge conosco a deixar o transitório e procurar pelo eterno; isto, não como ato de dever, mas como ação de amor. Quando esta voz é obedecida, o resultado será uma Inteligência espiritual; a qual, como diz Ruysbroeck novamente, pode – “ser semelhante ao nascer do sol, que enche o ar com seu brilho claro, iluminando todas as formas, mostrando a distinção de todas as cores”. Este dom espiritual assim, irradia o mundo todo com um novo esplendor e nos mostra segredos sobre os quais jamais antes cogitamos. Dele, os poetas conhecem vislumbres e dele procede seu poder; é que ele capacita os seus possuidores a viver verdadeiramente, a partir a perspectiva de Deus e não da perspectiva humana.”

(De uma Antologia do Amor de Deus, por Evelyn Underhill)
Extraído de The Anglican Digest, Pentecost 2008

ADORAÇÃO

“A Adoração é a primeira e a maior das respostas da vida ao seu ambiente espiritual; é o movimento primeiro e mais fundamental na direção do Espírito, a semente da qual todas as demais orações devem brotar. Ela está dentre as forças educativas mais poderosas, purificando o entendimento, formando e desenvolvendo a vida espiritual. Assim como jamais podemos conhecer o segredo da grande arte ou música, até que tenhamos aprendido e olhar e escutar com humilde reverência – alcançar uma beleza além de nosso alcance – assim a procura e o apreço permanecerão intocados, até que tenhamos aprendido a contemplar, ouvir e adorar. Somente então iremos adiante de nós mesmos e de nossa pobre visão, derramado-nos àquilo que nem conhecemos, escapando de nossa pequenez e de nossas limitações, para a a vida universal.”

Evelyn Underhill, The Golden Sequence, Methuen & Co. Ltd., 1932, página 162

Tradução de D. Luiz O. P. Prado para uso interno do SETEK