30 setembro 2007

Trindade XVII

Leituras do Domingo

Profecia de Amós 6.1, 4-7
Salmo 96.1-6, 14-16
I Carta a Timóteo 6.11-16
Evangelho de São Lucas 16.19-31


Mundos Separados

A parábola do Rico e do Lázaro é de fato perturbadora. Não há qualquer indício de que o Rico persiga ou oprima o Lázaro. O Rico poderia mesmo ser um crente, seguidor do Evangelho da Prosperidade, agradecendo a Deus pelas muitas bênçãos sobre ele derramadas. Talvez tivesse até algum grupo de oração em sua própria casa. O Rico simplesmente nem notava o Lázaro. Sua falha consistiu em percebê-lo só no momento em que passou a sofrer tormentos no Hades. Se achamos que esta é uma punição muito injusta, é melhor ponderar melhor nossa compreensão.
Por que penso que a punição foi injusta? Só porque o Rico não teria feito, deliberadamente, algo errado para com o Lázaro? Aqui discernimos a diferença entre o nosso pensar e o pensamento de Deus. Nós nos percebemos como indivíduos lutando por viver da melhor maneira que nos for possível. O esforço por alcançar tal visão pode nos preocupar de tal forma que simplesmente nem notemos o que acontece com os outros. Um partido político pode prometer a redução de impostos enquanto que a oposição pode prometer elevá-los. Assim, por que não votar pelo partido que nos promete impostos ou juros menores?
O pensamento de Jesus é diferente. Ele pensa não em termos de “eu” , mas de “nós” e “nós”, inclui todos os seres humanos. Que amplitude gloriosa de percepção, e quão ameaçadora é ela para as pessoas cuja segurança depende da habilidade em ignorar o sofrimento dos outros. O abismo entre ricos e pobres se alarga cada vez mais, não absolutamente pela falta de recursos, mas por uma distribuição muito injusta.

Gerard W. Hughes, God of Compassion

NOTA: Legenda para a FOTO: “Visita do Revdo Cônego Stephen Lyon, Partnership Secretary, Londres, aos alunos e Direção do SETEK, 28 de Setembro de 2007”

Festa de São Miguel e Todos os Anjos

Havia uma escada... e os anjos de Deus por ela subiam e desciam.”
Gênesis 28.10-17
Os anjos são muito populares em nossos dias. Pode-se acreditar em anjos – a palavra significa mensageiros – sem se preocupar em crer nAquele que os envia. Nossa cultura pinta para si mesma imagens de seres espirituais sem procurar por clareza quanto a que espécie de espírito existiria por detrás deles. Nossas imagens de anjos atendem ao anseio por realidades espirituais que possamos ver. A Escritura, a história do Deus que não pode ser visto, nesse sentido não nos ajuda muito.
Os anjos que a Escritura descreve são fugazes e misteriosos como o Deus mesmo de quem são mensageiros. O profeta Isaías diz de forma muito concreta – que os serafins têm seis asas – o que é alguma coisa, imagino. Mas o que me diz mais sobre o que os anjos possam parecer é o fato de que, a primeira coisa que sempre dizem ao encontrar alguém é – Não tenham medo! – Será que eles agiriam assim se fossem parecidos com nossos anjinhos de cartões de Natal? Creio que não.
É bom que celebremos a Festa de São Miguel, o espírito guerreiro, e também Todos os Anjos, num mesmo dia. O que quer que eles pareçam, devem ser, todos, muito santos e muito fortes.

Forward Day by Day

22 setembro 2007

Trindade XVI

Leituras de Domingo

Profecia de Amós 8.4-7
Salmo 138
I Carta a Timóteo 2.1-8
Evangelho de São Lucas 16.1-13



Oração de Compaixão

Em 1938 um homem morreu no Monte Atos. Era um homem simples, um camponês russo que chegou ao Monte Atos quando ainda andava pelos seus vinte anos e aí permaneceu por mais ou menos cinqüenta anos... Por um longo tempo esteve encarregado de supervisão das tarefas braçais do mosteiro. Os trabalhadores do mosteiro eram também jovens camponeses russos que vinham por mais ou menos um ano ou dois, só para reunir algum dinheiro... e então retornar às suas aldeias com algumas libras... para iniciar uma família, construindo uma habitação escavada na rocha e comprar o necessário para o trabalho em suas lavouras.
Um dia, outros monges, que também supervisionavam diferentes trabalhos, disseram – Padre Silouan, como se explica que as pessoas que trabalham sob seus cuidados o fazem tão bem, mesmo que o senhor não os fiscalize? Nós gastamos nosso tempo orientando-os em seus deveres e eles continuadamente tentam nos enganar? O Padre Silouan respondeu – eu não sei. Mas posso contar a vocês o que faço a respeito disso. Quando chego, pela manhã, nunca venho sem antes ter rezado pelos trabalhadores e venho com o coração cheio de compaixão e amor por eles, e ao chegar na área de trabalho, tenho lágrimas na alma de tanto amor por eles. Eu então designo as tarefas para o dia e, enquanto eles trabalham, rezo por eles. É assim que retorno à minha cela e rezo por todos eles, individualmente. Ponho-me diante de Deus e digo – Senhor, lembra do Nicolau. Ele é jovem, somente vinte anos, deixou sua aldeia e também sua esposa, mais jovem ainda que ele, e seu primeiro filho... – E assim – disse ele – passo os meus dias, rezando por todos deles, um após outro e, quando o dia termina, vou e lhes falo algumas poucas palavras, rezamos juntos e então retornam para o descanso. Aí, volto também eu para meu ofício monástico.

Anthony Bloom, School for Prayer


Desprendimento

Os cristãos devem ser claros com respeito aos bens e propriedades. Não devem condená-los, já que são coisas boas. Mas devem ser firmes e radicais com relação ao instinto possessivo que aí existe. Nestas coisas, Cristo pede por nada menos que tudo e rejeita qualquer concessão – certamente porque os fatos em si rejeitam tais concessões. Se não ajo firmemente contra meu instinto possessivo, serei por ele possuído. É ele que me possuirá e guiará. Serei aprisionado numa espiral sem fim de desejo, realização e, brevemente, tanto minha entrega a Deus quanto minha abertura para o próximo estarão aniquiladas. Na verdade, estes dois mandamentos de amor do evangelho pressupõem uma atitude de pobreza e desprendimento em relação ao eu, os quais são incompatíveis com um espírito aquisitivo. Talvez a razão pela qual falhamos tão freqüentemente em amar como devemos não se explique por algum defeito de amor em nós mas porque não temos disposição em dobrar a ganância e assim, inevitavelmente, nos colocamos antes dos outros. Chegando a uma situação mais conclusiva, nós nos agarramos às nossas próprias necessidades e deixamos o próximo em segundo lugar. Isto é verdade tanto para famílias quanto para indivíduos.
A entrega a Deus em adoração e ao próximo, em disponibilidade, implica em abrir mão, que é justo o oposto do espírito aquisitivo. Precisamos ser muito honestos conosco mesmos sobre nosso instinto possessivo. A menos que o arranquemos pela raiz, ele tomará conta e abafará todos os sentimentos bons em nossos corações, deixando só a preocupação egoísta. Jesus realmente falou sério ao dizer: Vocês não podem servir a Deus e ao Dinheiro.

John Dalrymple, Costing No Less Than Everything

16 setembro 2007

Trindade XV

Leituras de Domingo

Êxodo 32.1, 7-14
Salmo 51.1-11
I Timóteo 1.12-17
São Lucas 15.1-32


Fazendo os Milagres de Deus

Creio que muitas vezes olhamos simploriamente para Deus, no sentido de que Ele corrija toda a nossa fraqueza e restaure as conseqüências de nosso erro. Entendo que este tipo de oração reflete a vontade de Deus e também nossa súplica para que nos seja dada esta mesma forma de vontade. Mas não podemos esquecer que Deus considera o seu povo ao realizar milagres e vive uma vida que nos conduz na direção dos padrões que Ele mesmo propõe. Pensando em todas as faltas que existem hoje no mundo, bem sabemos que elas não podem ser colocadas na conta de Deus. Elas pertencem, de fato, à conta dos humanos que povoam esta terra, e também aos líderes do mundo que deveriam se conduzir e liderar rumo a direções muito melhores e diferentes.
Deus é Deus e é sempiterno. Não creio na santidade da vida de parte de indivíduos, pela simples razão de que a realidade nos faz ver a fome, o empobrecimento e a doença reafirmando que não existe santidade para tantas pessoas, embora sejam todas iguais aos olhos de Deus. Minha convicção firme é que as pessoas mais favorecidas, mais benditas ou mais afortunadas, seja pelo lugar onde vivem, ou pelas circunstâncias de seu viver... é que deveriam fazer muito mais pelas desigualdades e pelos injustiçados... até que tudo isso desaparecesse. Esta sim, é a vontade de Deus.

John Hermon, A Prayer in the Life


Ó Deus, criador e preservador de toda a humanidade;
Abençoa a todas as nações,
reconcilia os que estão em conflito,
cura a fome e a opressão,
alcança alegria aos que estão tristes,
paz e esperança para todos;
Por Jesus Cristo, nosso Senhor.
The Alternative Prayer Book




09 setembro 2007

Trindade XIV

Leituras do Domingo

Sabedoria de Salomão 9.1318
Salmo 1
Carta a Filemom 9-10, 12-17
Evangelho de São Lucas 14.25-33


Que espécie de Igreja?

Uma igreja fundada em misericórdia imerecida e sem restrições, bem pode ser uma igreja que não nos agrade; mas este foi o único tipo de Igreja que nos foi dado. Ela pode falhar em garantir nossas conquistas ou em proteger nossas vulnerabilidades; mas é a única Igreja capaz de oferecer espaço para uma nova vida, para nossas percepções rejeitadas ou para o amor inesperado do qual nosso futuro comum dependerá. Acima de tudo, é a espécie de Igreja que deveria existir se Deus realmente ama mais ao indesejado que aquilo que as estruturas humanas de poder costumam recompensar, a única espécie de Igreja que distribui a vida que vem da Cruz.
Este é o pertencimento que temos em Deus. Os momentos em que o experimentamos, e nos descobrimos amparados neste amor, são tempos também quando vemos que há mais a desejar, mais que o que podemos expressar. É um pertencimento mantido em aberto ao universo cujo esplendor ainda está por ser revelado. Espera-se que reconheçamos que o que desejamos e experimentamos, possa também acontecer nas vidas de outras irmãs e irmãos, por caminhos cheios de surpresa e distúrbios... mas que nós, no entanto, podemos saudar como promessas cumpridas.
Bispo Peter Selby, BeLonging: Challenge to a Tribal Church


Além de nós mesmos

A adoração é a primeira e a maior das respostas da vida ao seu ambiente espiritual; o primeiro e o mais fundamental dos movimentos do Espírito, semente de onde toda oração deve brotar. Ela está dentre as forças educativas mais poderosas que purificam a compreensão, formam e desenvolvem a vida espiritual. Assim como jamais podemos conhecer o segredo da grande arte ou música, não sem olhar e escutar com reverência desprendida, reconhecendo uma beleza que está além de nosso alcance – assim, a afirmação e o encanto permanecem incompreendidos até que tenhamos aprendido a olhar, a escutar e adorar. Somente então progredimos além de nós mesmos e de nossa pobre visão, derramando-nos naquilo que não conhecemos, sendo libertados de nossa própria limitação e pequenez ... para a vida universal.
Evelyn Underhill, The Golden Sequence

02 setembro 2007

Trindade XIII

Leituras do Domingo

Livro de Eclesiástico3.17-20, 28-29
Salmo 81.1, 10-16
Carta aos Hebreus 12.18-19, 22-24
São Lucas 14. 1, 7-14



Ouvindo com o Coração

A escuta responsiva é a forma que a Bíblia dá à nossa busca religiosa básica enquanto seres humanos. Trata-se da busca pela vida humana plena, por felicidade. É a procura por sentido, já que nossa felicidade não depende da sorte; ela depende da paz do coração. Mesmo em meio ao que costumamos chamar de má sorte, em meio à dor e sofrimento, podemos encontrar paz no coração, se conseguirmos ver o sentido que está em tudo. A tradição bíblica mostra o caminho ao proclamar que Deus nos fala até mesmo nas circunstâncias mais adversas. Escutando atentamente a mensagem de um dado momento seremos capazes de acolher a Fonte do Sentido e assim, compreender o sentido da vida.
Escutar desta forma significa escutar com o coração, com o ser inteiro. O coração permanece como o centro de nosso ser, aí onde estamos realmente “juntos”. Juntos conosco mesmos, não compartimentados em intelecto, vontade, emoções, corpo e mente. Juntos também com outras criaturas, pois o coração é o “espaço” onde, paradoxalmente, não só sou mais intimamente eu mesmo, mas estou mais profundamente unido com todos. Juntos com Deus, fonte da vida, a vida de minha vida, amparando o coração. Para escutar com o coração precisamos sempre novamente retornar ao coração, através de um processo de recolhimento, trazendo à ele todo o possível. Escutando com o coração descobrimos o sentido. Assim como os olhos percebem a luz e os ouvidos escutam o som, assim o coração é o órgão para o sentido.
David Steindl-Rast, A Listening Heart: The Art of Contemplative


Filhos de Deus

O Evangelho cristão declara que as pessoas são de inestimável valor porque são filhas de Deus, centro da preocupação de Seu amor, criadas com uma destinação eterna; não só as pessoas em geral, mas os indivíduos, homens, mulheres e crianças, cada um com seu nome, todos absolutamente sem preço. Tudo isto Jesus aclarou perfeitamente ao dizer para os discípulos – ... até os cabelos de vossas cabeças estão contados: esta é uma imagem extravagante, feita para ser levada para casa... Quando tomamos Suas palavras seriamente, começamos a compreender o alcance da significação. Se forem verdadeiras, se é mesmo assim que as coisas são, se é verdade que Deus cuida mesmo de cada pessoa individualmente, dentre os bilhões que habitam o mundo, para não falar das incontáveis gerações do passado e das que ainda nem nasceram, não podemos descartar quem quer que seja como não tendo importância; nem estamos autorizados a supor que alguns são mais importantes que outros, ou que alguém deve ser sacrificado para servir aos interesses que “ganhem” precedência sobre a dignidade que nos é inerente. As conseqüências de se aceitar esta pressuposição básica são alarmantes, colocando em questão não só a forma como agimos nas relações com nossos irmãos humanos, mas também para a política internacional, militar, econômica e social que têm sido e ainda são consideradas como razoáveis por aqueles que por elas são responsáveis.
Paul Rowntree Clifford, Government by the People?