17 janeiro 2013

OS CÍCLOS E O FIM: AMEAÇA OU ESPERANÇA?



Dr. Humberto Maiztegui Gonçalves[1]
Trabalho apresentado por ocasião da Semana de Oração
pela Unidade dos Cristão na UNILASALLE – 2012.

1.    Introdução

     Este assunto, mesmo que um tanto entediante por sua recorrência, encerra um retrato do sentido da existência humana no seu sentido mais profundo de pura sobrevivência e de transcendência. Vou, em um primeiro momento, mostrar como os ciclos são parte da vida e da ideia de existência humana, inclusive nas Escrituras Judaico-Cristãs, tirando deles os mais básicos ensinamentos sobre a sobrevivência, mas também sobre o papel das divindades e da relação da humanidade com o Universo. Mas que, no mito do Dilúvio, há uma denuncia contra uso terrorista da ameaça do fim e um manifesto de esperança da continuidade da vida em eterna aliança com Deus.

2.    Ciclos como forma de organizar uma cosmologia da vida e da morte, do começo e do fim.

      Antes da Bíblia, e antes de qualquer sistema religioso ou cosmológico vem a Vida. A fé nunca caiu do céu, mas da tensão entre três fatores:
a.    O sentimento humano de transcendentalidade (ou a pretensão humana de alguma forma sobrepujar o fato inexorável da morte).
b.    O contexto vital e a exigência cíclica da sobrevivência (coleta, caça, pesca, ciclos agrícolas, ciclos climáticos, dia e noite, etc.).
c.    A identidade dos grupos humanos e sua organização social, política, econômica e cultural (respondendo questões como quem somos, o que fazemos, o que comemos, o que vestimos, como falamos e como nos relacionamos com outros grupos e com o meio ambiente, etc.).
       Alguns biblistas, bem intencionados, com Wright (O Deus que Age, traduzido pela ASTE) tentaram demonstrar que a fé judaico-cristã ao contrário das chamadas “religiões naturais”, dentro das quais podemos colocar as religiões indígenas e a religião Maia, não estaria condicionada aos ciclos da vida. Por um lado, o que corretamente foi observado por estes estudiosos é que a fé judaico-cristã é fundada por mitos e acontecimentos fundantes de caráter mais histórico do que natural. Portanto, os ciclos bíblicos concentram-se mais no aspecto cronológico do que cosmológico. No entanto, os ciclos cosmológicos aparecem no centro da religiosidade israelita como forma de linguagem, até para se referir à manifestação de Deus na História do Povo. O primeiro ciclo a ser teologizado é o da SEMANA, isto é, o CICLO DE SETE DIAS, ou de SETE ESTÁGIOS.
           Mesmo que o Primeiro Mito da Criação, em Gn 1,1-2,4a, seja de origem pós-exílica, formulado a partir do encontro dialético entre a fé de Israel e a mitologia babilônica (presente em poemas como Gilgamesh e Enuma Elish) a instituição do sábado como dia de descanso é anterior ao exílio. O mesmo acontecia com o ANO SABÁTICO (quando as dívidas eram perdoadas e as terras liberadas para o acesso de todas as pessoas, cf. Dt 15,1-2) e depois o ANO DO JUBILEU (em um cíclo de 7 vezes 7 anos, deixando o ano 50 para a redistribuição da terra, cf. Lv 25,8). Este mesmo ciclo é resgatado pela comunidade do profeta Isaías que o usa como linguagem utópica, isto é, como o CÍCLO DOS CÍCLOS, quando o MESSIAS ou UNGIDO libertaria todo o povo de todas suas mazelas (cf. Is 61,2). Depois, segundo o Evangelho de Lucas, Jesus Cristo teria proclamado este mesmo ciclo como parte do sentido último da sua missão (cf. Lc 4,19).
          Assim o Ciclo passa a ser também uma linguagem ou uma imagem da realização última das esperanças de um povo, isto é, passa a ser um ciclo escatológico, e escatologia nos fala do fim, mas por ser um ciclo, também nos fala de um começo!
         Outra expressão cíclica judaico-cristã foi, ou ainda é, o milenarismo. O Salmo 90,4 diz que para Deus mil anos são como um dia, assim, quase que inocentemente, a Escritura Judaica dá ao menor ciclo natural (o do dia) um valor cronológico (mil anos). A partir disso, rabinos como Eliezer bem Josef propõem uma possível medição cronológica do Ciclo dos Ciclos[2]. Mas é claro que esta não foi a única! No livro de Daniel encontramos ciclos medidos em dias: um primeiro ciclo de 1290 dias e outro de 1335 dias, chegando-se ao “fim dos dias” (Dn 12,11-13).
         No livro de Apocalipse, que entendemos como uma grande liturgia de resistência contra a repressão do Império Romano contra as Igrejas Cristãs da Ásia Menor (mencionadas nos primeiros dois capítulos), a busca da resistência e da esperança resgata a visão dos ciclos milenares de opressão, depois dos quais aconteceria a grande libertação, não apenas dos males da história, mas da própria morte! (Ap 20,1-7.14). Mas, no mesmo livro também são usados os dias como medida de ciclos, assim como antes foi feito no livro de Daniel (1260 dias em Ap 11,3 e 12,6).
         Em geral o anuncio do Ciclo dos Ciclos é marcado por grandes catástrofes. Catástrofes que não são criadas pela cosmovisão cíclica, mas que fazem parte da experiência cotidiana dos povos que as formulam.  Contudo, quando as catástrofes são interpretadas no ciclo representam a esperança de um novo começo, e da plena realização dos todos sonhos humanos em harmonia com todas as qualidades divinas. O fim do mal conhecido é desejado e esperado, pois alimenta a resistência das pessoas que lutam, sofrem e trabalham por um recomeço melhor.

3.    O contra-mito do Dilúvio proclama o fim do fim.
         O contra-mito do Diluvio pode ser interpretado assim porque é uma contestação a tudo o que a mitologia babilônica usava como justificativa para a submissão dos povos. Os simples mortais existiam apenas para servir às divindades e seus representantes terrenos, cf. Enuma Elish. Na releitura do Dilúvio Bíblico, após descrever as hierarquias político-ideológicas dos opressores (como gigantes e filhos das divindades que usavam as filhas da humanidade para gerar valentes e heróis; cf. Gn 6,4), o protagonismo do fim passa para uma humilde família de simples mortais (6,8-9.18), isto é, dos oprimidos como sujeitos de um novo tempo de libertação!
           No Dilúvio morrem todos os opressores, todos os filhos das divindades, finalizando assim um ciclo de opressão. Acontece, portanto, o contrário do que os soberanos anunciavam. Antes os imortais “filhos das divindades” sobreviveriam e o povo morria. Agora o povo vive em harmonia com as criaturas e os filhos das divindades e seus descendentes é que morrem, dando origem a uma cosmologia alternativa. Mas, o manifesto não acaba ali! No final todas as criaturas vivas da terra, humanos e animais, celebram uma aliança tendo o Arco Iris como sinal do NOVO COMEÇO! Nesta nova aliança contra o terror, se proclama o seguinte:
Não tornarei mais a amaldiçoar a terra por causa do ser humano; porque a imaginação do coração humano é má desde a sua meninice, nem tornarei mais a ferir todo o vivente, como fiz. Enquanto a terra durar, sementeira e sega, e frio e calor, e verão e inverno, e dia e noite, não cessarão. Gn 8,21-22.
          Observem que Deus reafirma os ciclos da vida na agricultura, nas estações do ano, e no dia a dia, mas não como instrumento de terror, e sim como sinal de vida! Finalmente reafirma:
E eu convosco estabeleço a minha aliança, que não será mais destruída toda a carne pelas águas do dilúvio, e que não haverá mais dilúvio, para destruir a terra. E disse Deus: Este é o sinal da aliança que ponho entre mim e vós, e entre toda a alma vivente, que está convosco, por gerações eternas. Gn 9:11-12.
4.    Concluindo: o fim e o começo                             
       Portanto, sonhemos, falemos e vivamos a esperança do fim do ciclo que está nos levando ao fim, pela nossa própria capacidade de explorar tudo e todos sem o mais mínimo respeito. Esperemos o fim do domínio dos que se acham, ou querem ser vistos, como “deuses” ou “gigantes” ou “valentes”; e começo de um novo tempo da alegre harmonia e vital convivência entre todas as criaturas. 
      Parece, assim, mais produtivo, que em nossas mentes e corações haja um brilhante Arco Iris, muito mais voltado para o que vai tratar a conferência Rio + 20, e em todos os esforços para tornar este planeta mais habitável e sustentável para a vida em todas suas formas, do que no que nas profecias que certamente acabarão no dia 22 de Dezembro de 2012.



[1] Doutor em Teologia, área de Bíblia, Reitor do SETEK, recentemente foi sagrado Bispo Coadjutor da Diocese Meridional da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil.
[2] Gian-Luca POTESTÁ. Milenarismo. In: Dicionário de Teologia, p.1140.

EVANGELIZAÇÃO E PASTORAL NA EXPERIÊNCIA DE UMA PRESBÍTERA ANGLICANA



Revda. Claudia Prates[1]
Estudante do Curso de Aprofundamento de Estudos
(Convênio com o Curso de Integralização ESTEF)
                            1. Evangelização nos diversos níveis eclesiais
        Na tradição anglicana entendemos Evangelização como a tarefa indicada por Jesus para todas as pessoas batizadas e para a Igreja como seu Corpo Místico. A Igreja, do ponto de vista estrutural, acontece nos níveis global (ecumênico ou de uma tradição, como no meu caso a Comunhão Anglicana), regional ou Provincial (como o Brasil onde existimos como 19ª Província ou Igreja Episcopal Anglicana do Brasil), no nível local ou Diocesano (no meu caso a Diocese Meridional) e no nível comunitário ou Paroquial (no meu caso a Paróquia, onde sou pároca, a Paróquia São Paulo em Cachoeirinha RS).
      A Igreja Anglicana é parte da “Igreja Católica de Cristo”, portanto, não é possível a plena evangelização sem o correspondente engajamento ecumênico. Mesmo que nossa vida eclesial em todos os níveis seja autônoma, vivemos em diálogo com outras igrejas, com a humanidade e com a realidade como forma de cumprir a missão de Nosso Senhor Jesus Cristo.
       Quando falamos de “comunidade como mediadora da salvação” entendemos que ela é como diz 1 Cor 12, expressão do Corpo de Cristo. Portanto, é na comunidade que vivemos a comunhão com Cristo, entre nós e com a Missão de Deus. Comunidade é ponto de partida para a evangelização, mas também é lugar de re-evangelização permanente.
       As comunidades anglicanas vivem intensamente a teologia da encarnação. Vemos em nossas irmãs e irmãos (sem distinção) a imagem de Deus em Cristo, por isso mulheres e homens podem aceder a todos os níveis de ministérios da Igreja. Este fato não é para nós sinal de superioridade em relação as outras tradições cristãs, mas de serviço para a Igreja Ecumênica e para o mundo, como sinal do amor irrestrito e transformador de Deus.
     A comunidade escatológica se vive no sentido da “comunhão dos santos e santas”, no sentido de que a Igreja não começa conosco, nem termina conosco. Somos portadores de uma esperança mística maior, por isso nos dirigimos para o horizonte escatológico do Reino que já acontece entre nós e ainda não está complemente realizado. 

                2. Ação Evangelizadora

     A ação evangelizadora é a ação do Espírito Santo em cada pessoa e na comunidade. Para isso contamos com a participação democrática ou conciliar das pessoas na igreja. Em todos os níveis as instâncias maiores de decisão são democráticas. Isso significa que as comunidades não só executam a evangelização, mas a idealizam em um sentido de revelação mútua e dialogal. Isso traz alguns problemas práticos, como a distância entre o que se quer e o que se realiza, mas esta aí a tarefa pastoral e harmonizar as opiniões, buscar compromisso e unidade na ação evangelizadora (esta realizada tanto por ministros e ministras leigas, quanto ordenadas e, principalmente, pelo Bispo ou Bispa).
3.       Características bíblicas da ação pastoral evangelizadora
     Como exemplo bíblico do que mencionei acima, entendo melhor me basear no texto de I Coríntios 12,4-5. Neste texto a Igreja, descrita como um Corpo (v.12), é mostrada com uma diversidade de dons, com um mesmo Espírito, e diferentes ministérios (maneiras de servir), mas um único Senhor (v.4). Portanto, não podemos fazer prevalecer um ministério ou um dom sobre os outros ministérios e dons. Se fizermos isso estamos nos apropriando indevidamente doa unidade superior dada pelo Espírito e pelo Senhor (v.5)
      Com isso eu quero dizer que, mesmo sendo presbítera, e, portanto, tendo o ministério de “presidir” a comunidade (cf. I Tm 5,17; I Ts 5,12), não vale nada este ministério se não for exercido em comunhão com o Espírito, com o Senhor e, em consequência, com todas as pessoas que oferecem outros dons e ministérios para a Igreja. Portanto, eu tenho, como obrigação pastoral, identificar estimular e animar, para que toda a comunidade seja instrumento de missão e evangelização.
       


[1] Presbítera, egressa do SETEK, conclui em 2012 o Curso de Integralização na Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana (ESTEF). Atualmente é Pároca na Paróquia São Paulo em Cachoeirinha RS, na Diocese Meridional.


15 e 16 de Março de 2013
Centro de Convivência Reverendo Severo da Silva
Colônia Hidráulica.
Fone: (53) 23744646
Capão do Leão – Pelotas RS
Apoio: Centro de Estudos Teológicos de Pelotas (CETEPEL). Diocese Anglicana de Pelotas (DAP).
Inscrições no local
Informações: SETEK (33186122 – seminário.setek@gmail.com)




PROGRAMA DO CURSO DE VERAO 2013
15 de Março
14 às 17- Chegada, acolhida e inscrição.
17.30 - Celebração Eucarística de Abertura.
19 - Jantar.
20 - Apresentação geral (avaliação e rumos do Curso Semi Presencial SETEK-CETPEL para 2013; apresentação dos conteúdos a serem desenvolvidos neste Curso).
21.30 – Breve oração da noite.
22 – Descanso.
16 de Março
7.30 – Café da manha.
8.30 – Apresentação das diferentes formas de labor pastoral na Igreja a partir da prática da acolhida, do ministério colaborativo e da Missão de Deus.
9.30 – Trabalho em grupos.
10.15 – Intervalo.
10.30 – Apresentação dos grupos.
12.00 – Almoço.
13.30 –  Clínica Pastoral (definição do termo e sua relação com Aconselhamento, bibliodrama e dinâmicas de retiro espiritual).
14.30 – OFICINA I: Clínica Pastoral pessoal (visitação e outras formas).
15.30 – Intervalo
16. 00 – OFICINA II: Aconselhamento coletivo e técnicas de retiro, bibliodrama e outras.
17.00 – Avaliação geral do curso de verão e encaminhamentos.
17.30 – Oração Vespertina de Encerramento.
18.30 – Retorno.