09 fevereiro 2008

1º. Domingo da Quaresma

Leituras

Gênesis 2.4b-9,15-17,25-3.7
Salmo 51.1-13
Carta de São Paulo aos Romanos 5.12-19(20-21)
Evangelho de São Mateus 4.1-11


A Disciplina do jejum

"Algumas pessoas têm exaltado o jejum religioso elevando-o além das Escrituras e da razão; e outras o têm menosprezado por completo." John Wesley.

Em uma cultura onde a paisagem está pontilhada de restaurantes de todos os tipos, o jejum parece fora de lugar, fora de passo com os tempos. Com efeito, o jejum tem estado em geral descrédito, tanto dentro como fora da igreja, por muitos anos. Por exemplo, em minha pesquisa não consegui encontrar um único livro publicado sobre o jejum, de 1861 a 1954, um período de quase cem anos. Mais recentemente desenvolveu-se um renovado interesse pelo jejum, muito embora ele seja freqüentemente dogmático e carente de equilíbrio bíblico.
Que é que explicaria este quase total menosprezo por um assunto mencionado com tanta freqüência nas Escrituras e tão ardorosamente praticado pelos cristãos através dos séculos? Duas coisas. Em primeiro lugar, o jejum como resultado das excessivas práticas ascéticas da Idade Média, adquiriu uma péssima reputação. Com o declínio da realidade interior da fé cristã, desenvolveu-se uma crescente tendência para acentuar a única coisa que sobrou, a forma exterior. E sempre que existe uma forma destituída de poder espiritual, a lei assume o comando porque ela sempre traz consigo um senso de poder manipulador. Daí que o jejum foi submetido aos mais rígidos regulamentos e praticado com extrema automortificação e flagelação. A cultura moderna reagiu fortemente contra esses excessos e tendeu a confundir jejum com mortificação.
O segundo motivo por que o jejum passou por tempos difíceis no século passado é a questão da propaganda. A publicidade com a qual somos alimentados hoje convenceu-nos de que se não tomarmos três boas refeições por dia, entremeadas com diversas refeições ligeiras, corremos o risco de morrer de fome. Isto, aliado à crença popular de que é uma virtude positiva satisfazer a todo apetite humano, fez que o jejum parecesse obsoleto. Quem quer que seriamente tente jejuar é bombardeado com objeções. “Entendo que o jejum é prejudicial à saúde”. “Ele minará as suas forças e assim você não poderá trabalhar.” “Não destruirá ele o tecido saudável do corpo?” Tudo isto, naturalmente, é rematada tolice baseada no preconceito. Embora o corpo humano possa sobreviver apenas durante breve tempo sem ar ou sem água, ele pode passar muitos dias – em geral, cerca de quarenta – antes que comece a inanição. Sem que seja preciso concordar com as infladas alegações de alguns grupos, não é exagero dizer que, quando feito corretamente, o jejum pode ter efeitos físicos benéficos.
A Bíblia tem tanto que dizer a respeito do jejum que faríamos bem em examinar uma vez mais esta antiga Disciplina. O rol dos personagens bíblicos que jejuavam torna-se um “Quem é quem” das Escrituras: Moisés, o legislador; Davi, o rei; Elias, o profeta; Ester, a rainha; Daniel o vidente; Ana, a profetisa; Paulo, o apóstolo, Jesus Cristo, o Filho encarnado. [...] O jejum, está claro, não é uma Disciplina exclusivamente cristã; todas as grandes religiões do mundo reconhecem seu mérito. Zoroastro praticava o jejum, como o fizeram Confúcio e os iogues da Índia. Platão, Sócrates e Aristóteles jejuavam. Mesmo Hipócrates, pai da medicina moderna, acreditava no jejum. Ora bem, o fato de que todos esses indivíduos, na Bíblia e fora dela, tinham o jejum em alta conta não o torna certo ou mesmo desejável; isto, porém, deveria levar-nos a fazer uma pausa e nos dispormos a reavaliar as suposições populares de nosso tempo concernentes à Disciplina do jejum.

[Fonte: FOSTER, Richard. “Celebração da disciplina”. São Paulo: Vida, pg.63-65, 1995].